Futuro em mãos - Gazeta Esportiva
Theo Certain
São Paulo, SP
01/18/2019 15:00:41
 

Diferente do futebol, o basquete brasileiro ainda tem dificuldades para lapidar novos talentos. São raros os jovens jogadores que realmente despontam em nível nacional, abrindo a possibilidade de seguir carreira nas principais ligas do mundo. Quebrar esse paradigma, porém, pode não ser uma missão tão inalcançável assim. Para Yago Mateus, pelo menos, não é.

Aos 19 anos de idade e apenas no terceiro da carreira profissional, o armador do Paulistano possui currículo de gente grande. São duas finais de NBB (Novo Basquete Brasil) e duas de Paulista para ele, com um título em cada. Frequentemente convocado para a Seleção Brasileira, acaba de ser selecionado para o seu segundo Jogo das Estrelas e, no último mês de dezembro, foi eleito pelo COB (Comitê Olímpico do Brasil) como atleta do ano no basquete.

Nada mal para o garoto que deu seus primeiros arremessos em uma creche de Tupã, cidade no interior de São Paulo, e que também se impressiona com seu promissor início de carreira.

Aos 19 anos, Yago já é um dos principais nomes do basquete nacional (Foto:Sergio Barzaghi/Gazeta Press)

“Não imaginava que conquistaria tanto em tão pouco tempo. Eu cheguei no Paulistano e foi bem difícil me adaptar ao profissional. Mas agarrei a grande chance que eu tive. Dali eu só fui crescendo e conquistei muitas coisas. No meu primeiro ano, já cheguei em uma final de NBB e jogando. E ganhar o Prêmio Brasil Olímpico, de melhor atleta de 2018, foi algo que eu não esperava e acabou acontecendo bem rápido”, afirmou, em entrevista exclusiva à Gazeta Esportiva.

Yago não apenas recebeu o Prêmio Brasil Olímpico, como se tornou o jogador de basquete mais jovem a alcançar o feito desde sua criação, em 1999.

“É fruto do trabalho que eu venho desenvolvendo há muito tempo. Quando fiquei sabendo que eu tinha ganhado, fiquei muito surpreso, e ainda mais em saber que eu fui o mais jovem a conquistar isso. Foi um sonho que se realizou e é uma coisa que vai ficar gravada na minha memória para sempre”, contou.

Yago é o jogador de basquete mais jovem a receber o Prêmio Brasil Olímpico (Foto: Alexandre Loureiro/COB)

Dentre os nomes já eleitos pelo COB, estão os de Anderson Varejão e Leandrinho, dois dos principais jogadores da última geração nacional, que são adversários de Yago no NBB e companheiros do mesmo na Seleção. Duas referências para o jovem armador, que é só elogios ao comentar a relação que leva com o pivô do Flamengo e o ala do Minas, respectivamente.

“Varejão e Leandrinho são caras de outro nível. São caras com quem eu aprendo a cada dia, só de olhar para eles. Acima de tudo, são caras do bem, que ensinam. Essa é a grande diferença. Aprendi muito com os dois, assim como com Marcelinho Huertas, (Vítor) Benite… São jogadores mais velhos, que estão olhando para a nova geração e estão apoiando de maneira incrível”, destacou.

A Seleção Brasileira, por sinal, está a dois jogos de carimbar o passaporte para o Mundial deste ano, marcado para o mês de setembro, na China. Os comandados de Alexandar Petrovic precisam de uma simples vitória nas últimas duas rodadas do Qualificatório, contra Ilhas Virgens e República Dominicana, para selar a classificação.

“É uma seleção de muita qualidade e que está jogando de maneira diferente. O Petrovic está fazendo um grande trabalho, está convocando os jogadores que estão apresentando resultado. Faltam dois jogos, precisamos ganhar um para classificar. Mas assim que classificar o foco muda e, até o Mundial, vai estar todo mundo melhor, todo mundo mais preparado para ir lá e fazer o melhor”, assegurou.

Na visão de Yago, o Brasil tem totais condições de fazer frente às principais seleções do mundo. E ainda que o nível do campeonato local continue abaixo, por exemplo, das ligas europeias, para não falar no basquete norte-americano, o camisa 2 do Paulistano vê uma melhora no cenário.

“Enxergo uma evolução. Ter jogadores como Varejão, Leandrinho, jogando aqui é a prova maior da qualidade do NBB. São jogadores que já jogaram no mundo inteiro e que, mesmo assim, estão bem aqui, estão gostando, e, principalmente, tendo dificuldade para jogar”, ressaltou.

E se o nível da liga nacional tem evoluído, ela está cada vez mais equilibrada. Metade da primeira fase já passou e cinco times brigam diretamente pelas quatro primeiras posições da tabela. Atual campeão, o Paulistano ocupa a quarta colocação, com 12 triunfos e quatro derrotas até o momento, e, segundo o armador, terá de correr em dobro se quiser chegar ao segundo título consecutivo.

“Chegar no topo é fácil, difícil é se manter. Acho que somos o time a ser batido, por sermos os atuais campeões, e estamos fazendo um grande campeonato. Está bastante embolado, mas estamos no meio e vindo de uma sequência muito boa. Os jogos que perdemos foram por detalhe, por vacilo nosso, o que faz a gente ter ainda mais confiança”, declarou.

Em menos de três anos, já é campeão paulista e brasileiro pelo Paulistano (Foto: Sergio Barzaghi/Gazeta Press)

Além do NBB, a disputa da Liga das Américas também agita o calendário do Paulistano neste primeiro semestre. A estreia, por sinal, é nesta sexta-feira, contra o Titanes de Barranquilla (COL), pelo Grupo A da competição, que também conta com Atena (ARG) e Malvin (URU). No Ginásio Antônio Prado Júnior, casa do time brasileiro, a bola sobe às 20h30 (no horário de Brasília).

“O Paulistano já se firmou dentro do Brasil, como um dos melhores times, mas agora temos outro desafio, que é se firmar na América. E para gente conseguir isso temos que passar pela Liga das Américas, que é um campeonato bem difícil, que muda o patamar, mas que temos totais chances de chegar a uma final, semifinal, que seria muito importante para a gente”, salientou.

Em meio a tantos compromissos, Yago também deve se movimentar para definir seu futuro. Há pouco menos de um ano, se inscreveu pela primeira vez ao Draft da NBA, e não seria surpresa alguma se fizesse o mesmo em 2019. Apesar de tanta expectativa ao seu redor, o jovem mantém os pés no chão e garante ainda não saber se, de fato, tentará a sorte no próximo recrutamento.

“Eu costumo não pensar nisso, deixo as coisas acontecerem. Comecei a jogar nas finais de campeonato sem pensar que jogaria, e fui bem. Tem muita coisa para acontecer ainda, preciso fazer muito antes, e deixo que outras pessoas cuidem dessa parte para mim. Tenho meu sonho de jogar lá fora, de mostrar meu basquete, mas ainda faltam algumas coisas para acontecer”, amenizou.

A entrada na NBA ainda é tratada com cautela pelo armador (Foto:Sergio Barzaghi/Gazeta Press)

O armador sabe que, pelo simples fato de ser estrangeiro e não fazer parte da liga universitária dos Estados Unidos, terá um complicador a mais para ser escolhido no Draft. Mas, por outro lado, também tem ciência de que não há outro jeito de quebrar essa barreira a não ser dentro de quadra.

“Eles dão muita moral, muita preferência para jogadores que acompanham desde moleque. Acho que esse ‘preconceito’, como dizem, morre na quadra, quando colocam um para jogar contra o outro. Os jogadores de lá tem muita força física, enquanto aqui, na Argentina, Espanha, é inteligência pura. Vai do talento, da pessoa chegar lá, mostrar o que sabe fazer e acabar com isso”, pontuou.

Quando questionado em relação às suas maiores referências na NBA, Yago não hesita ao apontar Stephen Curry, do Golden State Warriors, como o jogador com quem mais se identifica. E com 1,78m de altura, é natural que o brasileiro também se espelhe no ‘baixinho’ Isaiah Thomas, de 1,76m, do Denver Nuggets, pelo estilo de jogo inventivo.

“Eu costumo assistir bastante o Stephen Curry jogar, o Isaiah Thomas. São jogadores que não possuem tanta força física e que conseguem ser diferentes. Por ser minha característica, de não ter muita força física, ter que fazer algo diferente é o que acaba elevando o meu jogo”, disse.

Yago tem Stephen Curry como principal referência dentro de quadra (Foto:Sergio Barzaghi/Gazeta Press)

Yago Mateus é, sem sombra de dúvidas, o principal nome da nova geração do basquete nacional. Mas este processo de renovação não pode se apoiar apenas nele. É preciso continuar revelando para alcançar um patamar mais alto. Afinal, como o próprio armador faz questão de afirmar, o país está repleto de outros Yagos, Varejões e Leandrinhos.

“O basquete brasileiro tem muitos talentos e muitos talentos a serem lapidados. Mas precisam de oportunidades. Eu tive uma oportunidade muito grande e agarrei, assim como outros jogadores, de maneiras diferentes. O Brasil tem uma geração muito talentosa, de muito potencial e que vem para fazer a diferença. Precisa dar oportunidade”, finalizou.