No ano passado, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto que libera os clubes se tornarem empresas, algo parecido com o que ocorre na Europa. Hoje, qualquer clube pode ser uma companhia. Há a possibilidade de nascer empresa, a exemplo do Red Bull Brasil, como deixar de ser uma associação e virar uma empresa, como Red Bull Bragantino e Botafogo-SP.
Atualmente, em sua maioria, os clubes são entidades sem fins lucrativos e se tornariam sociedades limitadas ou até mesmo anônimas.
O Lyon, Manchester City, Juventus e RB Leipzig são casos de sucesso desse novo modelo de gestão. Mas a exceção não corresponde à regra. Na própria Europa, alguns clubes optaram por essa transformação e acabaram por se afundar nas dívidas e ver o rendimento esportivo se assolar. Os tradicionais Parma, Fiorentina e Napoli são exemplos de falência ao longo da história do futebol italiano.
"Não acho que os clubes devem virar empresas. Eles precisam modernizar a gestão. Ser empresa ou não vai depender mais de oportunidades e preparo das instituições para assumir a situação", disse César Grafietti, economista e consultor do banco Itaú de temas relacionados às finanças do futebol.
Basicamente, a decisão de transformar a agremiação em empresa carrega consigo mudanças drásticas no dia-a-dia dos clubes e, como qualquer mudança, dispõe de riscos e chances. Uma delas é a perda geral de poder dos dirigentes. A venda para acionistas faria com que gerentes e conselheiros perdessem espaço e controle das ações em função do poder concentrado.
Quem também pode perder muito com a alteração são os esportes olímpicos. O futebol é o carro chefe financeiramente dos clubes, indiscutivelmente a maior fonte de renda e impulsiona modalidades que tem menos apelo e visibilidade. O futsal do Corinthians e o basquete do Flamengo são sucessos em razão dessa ideologia. Ao vender a atividade oriunda de recursos, essas equipes vão precisar gerar receitas independentes, serem bem geridas ou até mesmo se encerrar.
Outro ponto importante é o abandono dos proprietários. Os donos podem simplesmente perder o interesse em investir no clube, focando-se com os ganhos em venda de jogadores e publicidade. Há o risco da marca ser explorada financeiramente e largada no âmbito esportivo. Este tema implica também na chance de falência.
Uma associação, modelo vigente em quase todo Brasil, pode sofrer insolvência civil- o clube ter mais obrigações do que rendimentos para cobrir tais pagamentos, bastante similar à falência. Como há uma rotatividade de mandatários, regida pelo sistema presidencial, o fato de não haver responsáveis pelo ativo dificulta essa ação. Na realidade, é improvável a insolvência de um clube de futebol em decorrência das oportunidades que envolvem o capital- compra e venda de jogadores, bilheteria, publicidade. Mesmo que em estado crítico, os clubes se mantém.
Já no modelo empresarial, a situação se reverte. Uma empresa pode falir. A falência no futebol implicar em ter de reiniciar todas as competições estaduais e nacionais da última divisão.
Diante desse cenário, quem iria assumir um clube brasileiro na atual crise?
"Não vai chegar um xeique no Brasil com um 1 bilhão de reais. Pode ter certeza. Não acredito em mágica, de que um investidor chegue no Brasil, em um clube que deve mais de R$ 700 milhões, como o Corinthians, com esse dinheiro para curar as dívidas, mais 500 milhões para folha salarial. Acreditar que o clube-empresa vai ser a solução de tudo é um pouco de ilusão", comentou César.
"O real está em baixa, então colocar 300 milhões de euros não é inconcebível. Mas, pensando friamente, com esse valor se compra outros clubes da Europa, e lá, num país que não seja das grandes ligas, se consegue chegar em uma Liga Europa, se consolidar nacionalmente", completou.
A discussão de clube-empresa ou associação é bastante complexa e deve ser levada com muito cuidado. Independente do modelo, a gestão deve ser profissional e responsável, somente assim qualquer instituição sobrevive à longo prazo.