Minha casa, minha vida - Gazeta Esportiva
Bruno Ceccon
Diadema, SP
08/26/2018 00:01:20
 

Parte dos 104 anos de história da Sociedade Esportiva Palmeiras, completados neste domingo, está meticulosamente organizada em um dos cômodos da casa de Valdir Vital de Araújo. Morador de Diadema, o torcedor conta com o aval da esposa Bia, corintiana, para montar um memorial dedicado ao clube fundado por imigrantes italianos em 26 de agosto de 1914.

Filho de um corintiano, Valdir foi levado ao estádio pela primeira vez por um vizinho palmeirense e, desde então, cultiva o amor pelo clube alviverde. Com apenas 12 anos, passou a recortar nas páginas do jornal A Gazeta Esportiva as notícias sobre o time de coração e iniciou o processo que culminaria com a inauguração de seu próprio memorial, em 26 de agosto de 2017.

“Desde menino, sou fanático pelo Palmeiras. Sempre quis saber sobre os jogadores, sobre o pessoal das décadas de 1940 e 1950, sobre a mudança de nome do clube. Mas, na época, tinha muita dificuldade para chegar a essas respostas, porque não havia tanto acesso a informação”, descreveu Valdir, de 52 anos. “Independentemente de Ademir da Guia, também queria saber de Bizu, de Bandeira, da época da fila”, contou.

O acervo do morador de Diadema, reunido ao longo de cerca de 40 anos e constantemente atualizado, é vasto. Valdir tem fotos ao lado de jogadores de diferentes gerações, incluindo os ídolos da Academia de Futebol e praticamente todo o elenco campeão da Copa Libertadores 1999. Além de pôsteres, faixas de campeão, quadros, ingressos, grama do Palestra Itália e cadernos com anotações sobre cada jogo, prática iniciada em 1987 e mantida até hoje.

“Fico bastante aqui e gosto muito desse espaço. Tenho meu trabalho, mas, dentro do possível, estou sempre pesquisando, lendo. Eu leio muito. Costumo dizer que essa é minha cachaça, porque não fico sem. Todos os dias, compro jornal pela manhã e faço meu acervo”, contou o atual gerente de padaria e ex-proprietário de uma banca, dono dos arquivos completos do jornal Lance! e da revista Placar.

Derby do amor
Detalhista, Valdir tem pastas de fotos de atletas divididos por posição, com os respectivos números de  jogos e gols – até o centroavante Jardel, que nem sequer entrou em campo, está no acervo. O torcedor coleciona ainda copos, canecas, bichinhos da Parmalat, camisas e livros, entre outros itens espalhados pelo sobrado que divide com a corintiana Carla Sinatra dos Santos, mais conhecida como Bia, um ser humano dotado de muita paciência.

“Os opostos se atraem, né, cara? Costumo falar que é minha inimiga íntima”, sorriu Valdir, ao lado de Bia há 35 anos. “Não temos filhos. Sei que, para acompanhar isso, é difícil. Muita gente pergunta: ‘Pô, mas e a sua esposa?.’ Eu agradeço por ela entender minha paixão de ter esse espaço dentro de casa”, completou o torcedor, frequentador assíduo do Allianz Parque.

Valdir e Bia costumavam ir aos estádios nos dias de Derby (cada um em seu setor), hábito encerrado pelos jogos com torcida única. Ambos jamais veem o clássico pela televisão juntos e, para evitar maiores atritos, desenvolveram uma espécie de código que impede a tiração de sarro. Trajada com uma camisa do Corinthians cheia de autógrafos, ela garante que o relacionamento é tranquilo.

“Assistir junto é impossível, mas não tem estresse. O Valdir gosta do Palmeiras dele e eu, do meu Corinthians. É um homem que não bebe nem fuma. Então, a diversão dele é essa”, contou, despreocupada com possíveis Derbys na Copa do Brasil e na Libertadores. “Ganhando ou perdendo, o máximo que vamos fazer é dar uma risadinha um para o outro”, disse Bia, dona de uma pequena coleção de artigos alvinegros.

No cômodo que abriga o memorial alviverde, não há nem um centímetro quadrado das paredes que não esteja ocupado. Em caso de título na temporada em que o Palmeiras completa 104 anos de fundação, Valdir Vital de Araújo, admirador do técnico Luiz Felipe Scolari, promete encontrar espaço para aumentar sua galeria no humilde bairro de Serraria.

“Espero que o Palmeiras passe pelo Cerro Porteño. Aí, quem sabe do outro lado não venham eles de novo? Seria lindo reviver 1999 e 2000, com o Felipão”, afirmou, em alusão aos triunfos sobre o Corinthians pela Copa Libertadores. “Ser bicampeão e partir para o Mundial seria um presente maravilhoso”, imaginou, cercado por imagens dos responsáveis pelas principais conquistas do clube fundado como Palestra Itália.

Weslley (e) e Weverton foram mascotes e acompanham jogos ao lado de Valdir na arena (Imagem: Reprodução)

FAMÍLIA PALMEIRAS

Frequentador assíduo do Allianz Parque, Valdir Vital de Araújo não costuma acompanhar os jogos do Palmeiras sozinho. O torcedor tem como leais companheiros o sobrinho Weslley Araújo de Morais e o afilhado Weverton Silva Alves, que por anos entraram em campo como mascotes do time profissional.

“O Valdir não tem filhos com a minha tia, mas pôde passar o que sente pelo Palmeiras para mim e para o Weverton”, contou Weslley, de 18 anos, aluno do curso de jornalismo e presente em algumas fotos de times posados do memorial do tio. “Eu me sinto muito feliz por estar de alguma forma inserido na história”, contou.

O sentimento de gratidão em relação a Valdir é compartilhado por Weverton. “Graças a ele, o Palmeiras nos ensinou muita coisa e conhecemos bastante gente. Até hoje, sofremos, festejamos e damos risada. Sempre com o clube em primeiro lugar”, afirmou o estudante de administração de 29 anos.