Café da aposentadoria - Gazeta Esportiva

05/10/2024 07:00:54
 

Por Rodrigo Matuck

Dois títulos do Campeonato Paulista, dois da Copa do Brasil, um da Série B e convocação para a Seleção Brasileira. É com esse currículo que Wesley, ex-jogador de Santos, São Paulo e Palmeiras, decidiu pendurar as chuteiras, em março de 2023.

A aposentadoria aos 35 anos, entretanto, não estava nos planos do meio-campista. Em entrevista exclusiva para a Gazeta Esportiva, Wesley revelou que foi pego de surpresa com um pedido de seu empresário, durante um café na capital paulista, e não teve escolha a não ser antecipar o fim da sua carreira.

“Eu saio de Santos, subo a serra para tomar um café e, quando desço, sou um ex-atleta. Não era o que estava no meus planos, porém eu não costumo desperdiçar oportunidades, ainda mais com pessoas que a gente gosta e confia”

“Teoricamente eu ia jogar mais dois anos. Um clube que estava na Série B na época me fez uma proposta muito boa, esse clube até subiu para Série A. Eu acho que atrapalhar eu não ia, acho que eu ia ajudar. Mas eu fui pego de surpresa pelo meu antigo empresário, que é um cara muito correto e honesto. A gente criou uma carreira muito bacana e uma irmandade. Ele me chamou para tomar um café e me aposentou porque queria dar um tempo do futebol. Fui pego de surpresa. Ele já estava com tudo pronto para que eu assumisse a empresa”, explicou.

Wesley começou a sua carreira no Santos, em 2007. Após duas temporadas recebendo algumas chances no profissional da equipe, acabou sendo emprestado ao Athletico-PR. Em 2010, ele retorna ao Peixe para fazer parte de um time histórico, acompanhado de Neymar e Ganso.

A sua segunda passagem pela Vila Belmiro, aliás, foi o momento mais marcante dos seus 17 anos de carreira.

“O Dorival Júnior tinha muita confiança na gente. Foi ele quem abriu a nossa mente. Eu nunca vi nada igual aquele time. O primeiro trabalho com bola, ele planejou dar 35 minutos. Ele teve que parar com 15 ou 20 minutos porque a bola não saía, de tanta qualidade técnica que tinha. Ele nunca tinha visto aquilo e para gente era normal, só que a gente não tinha percepção do que estávamos fazendo”, comentou.

Wesley disputou 85 partidas pelo Santos, marcou 10 gols e deu duas assistências (Foto: Divulgação/Santos FC)

“O Neymar ninguém sabia que ia acontecer, o Ganso, com uma inteligência fora do normal, mas também ninguém sabia o que ia acontecer…era tudo incógnita. E aí monta um time com Durval, Dracena e Léo e deu nisso. É uma história que eu vou levar”, ampliou.

Bate-volta na Europa

Em meados de 2010, Wesley tomou a decisão de se aventurar no Velho Continente. O seu destino foi a Alemanha. O Menino da Vila vestiu a camisa do Werder Bremen por 31 compromissos. Por lá, foram dois gols e duas assistências.

“Eu tive cinco propostas na época, de Porto, Benfica, Shakhtar Donetsk, a renovação do Santos e o Werder Bremen. Eu vi a vontade e todo o empenho que o Werder estava fazendo para me levar e isso me atraiu bastante. Eu tive uma boa experiência. Eu poderia, sim, ter ficado por mais tempo, mas futebol é dinâmico. Apareceu essa possibilidade de voltar e resolvemos aceitar”, disse.

A vaquinha

O retorno ao Brasil foi para jogar no Palmeiras, clube que mais defendeu na carreira, com 102 partidas, 12 bolas na rede e 11 passes para tentos. Mais do que gols e títulos, um fator inusitado chamou a atenção em sua chegada ao Verdão.

Para tentar contratar o então jogador de 25 anos, a diretoria do Palestra, na época liderada por Arnaldo Tirone, abriu uma vaquinha para que torcedores doassem dinheiro.

“Eu nunca soube de nada. Eu estava em um país de primeiro mundo, ganhando em euro, bem, e aí acontece uma situação de voltar para o Brasil. Eu não podia voltar na incerteza, eu tinha que voltar com tudo certo. Foi o meu irmão que me mandou o link para mim falando dessa suposta vaquinha. Eu fui pego de surpresa, não era do meu conhecimento, mas faz parte, aconteceu comigo”, declarou.

Wesley foi campeão da Série B pelo Palmeiras (Foto: Djalma Vassão/Gazeta Press)

“Se você me perguntar se eu concordo, eu digo que não. A gente vive em um país onde acontecem muitas situações, com muita pobreza ainda”

“Tem situações maiores para a gente olhar e prestar bem atenção. Eu levei na boa, porque já não tinha o que fazer. Algumas pessoas me davam uma nota de R$ 2,00 para assinar e falavam que ajudou a me contratar. Nunca concordei, mas fui obrigado a participar porque eu já era um funcionário do clube, eu estava na onda já”, completou.

O projeto não foi para frente. O clube alviverde conseguiu apenas R$ 832 mil e devolveu a quantia aos que colaboraram.

A trajetória de Wesley no Palmeiras se encerrou no final de 2014, quando decidiu pular o muro e partir para o São Paulo. Vestir a camisa tricolor era um desejo antigo do meio-campista, mas a realidade não atendeu às expectativas.

“Quando eu era moleque, fui para o São Paulo, passei no teste e depois de dois meses fui dispensado. Até então, eu não tinha conhecimento nenhum e voltei para casa. Depois de muito tempo, fiquei sabendo que a pessoa que me levou, pediu muito dinheiro para o pessoal e acabaram me dispensando. O futebol, ainda mais aqui no Brasil, dispensa um, tem outro. O São Paulo entendia, na época, que não faria sentido nenhum. Eu acabei sendo dispensado muito novo”, relembrou.

“Mesmo assim, as coisas aconteceram e eu tinha essa vontade de poder ir para o São Paulo porque foi uma situação que ficou para trás. Então, quando pintou a oportunidade, acabei indo, mas foi uma decisão errada. O São Paulo é um grande clube, todo mundo sabe da história, mas desportivamente para mim não foi legal. Eu tinha tudo no Palmeiras. Eu fui campeão, recoloquei o time para Série A, tinha todo glamour, era capitão do time, apesar de não ter perfil nenhum. Foi uma decisão que eu me arrependi desportivamente. No Palmeiras até hoje a minha relação pessoal é incrível”, ampliou.

Wesley jogou por duas temporadas no São Paulo (Foto: Djalma Vassão/Gazeta Press)

“Imagina você estar no lugar onde você tem todo o prestígio, ganha bem, está feliz e toma uma decisão só porque aconteceu uma situação no passado. Acho que tem que repensar e ter tranquilidade para tomar esse tipo de situação. Uma decisão bem complexa. Mas joguei no São Paulo, que sempre passou por alguns períodos complicados. Comigo não foi diferente. Vi jogadores de qualidade serem dispensados ou serem emprestados para outros clubes. Mas está feito. Acho que a gente tem que refletir e passar para os mais novos esses tipos de situações. Hoje, com 36 anos, talvez não teria feito isso, mas a gente só amadurece quando passa por algumas situações do tipo”, completou.

Apesar do arrependimento, foram 81 partidas pelo São Paulo, com dois gols e três assistências. Nos anos seguintes, Wesley passou por Sport, América-MG, Criciúma, Avaí, CRB e Ponte Preta, onde encerrou a carreira. Hoje, o ex-jogador olha para trás e sente orgulho do que construiu.

“Joguei em grandes clubes. Joguei na Europa, fui para a Seleção Brasileira. Posso, na minha humilde opinião, considerar uma carreira de muito sucesso. Eu posso me considerar um vencedor e um atleta de alto nível perante ao que o futebol exige. Eu já vi muitos e muitos caras estarem em times grandes, com salário alto e contrato de cinco anos, e não não aguentarem a pressão, ficar dois meses e pedir para ir embora, abrir mão do contrato. Eu já vi tudo isso. Isso só mostra o quanto eu tive garra, vontade e humildade de escutar até algumas situações que talvez eu não merecia, principalmente no nível de carreira que eu atingi. Uma palavra que define é vencedor, Vencedor, realizado e feliz de tudo que o futebol me proporcionou”, contou.

“Não sinto falta de nada, estou muito realizado. Deus me deu muito mais do que eu pedi quando era moleque nas minhas orações. Só tenho que agradecer e agora eu estou nesse novo projeto, que tomou uma proporção muito grande e rápida”, ampliou.

Wesley jogou ao lado de Neymar e Ganso no Santos (Foto: Ricardo Saibun/Santos FC)

Atualmente, Wesley é CEO da Heroes Mkt Sport, empresa que realiza assessoria humanizada para atletas de futebol, como a própria se descreve em suas redes sociais.

“Eu faço o gerenciamento de carreira de atletas mais novos e acabou entrando alguns atletas profissionais de potencial também. Eles estão na Europa e aqui no Brasil. Isso nos motiva. Nem a gente imaginava que ia ser tão rápido assim. A gente fica muito feliz. Isso só nos motiva para continuar firme na pegada porque não é fácil, mas quando você vê as coisas acontecendo e as pessoas felizes, nos motiva. A gente acompanha as histórias e a evolução desses atletas. É muito gratificante. Eu me encontrei e quero continuar aqui para ver muitas histórias de sucesso acontecerem”, detalhou.

O ramo pode até ter encantado o bicampeão da Copa do Brasil, mas, ao ser questionado se é mais fácil jogar bola ou gerir uma carreira, ele não pensou duas vezes na resposta.

“Jogar bola! Ser atleta é ser glamouroso, só faltam te pegar no colo. Jogar é muito mais tranquilo do que gerir carreira, mas eu só tenho a agradecer. Sei que vem coisas por aí e eu estou pronto, com toda a experiência que eu e minha equipe temos. A gente tem uma estrutura muito bacana e vamos fazer história. Temos o conhecimento de que é estar formando um atleta. Com a cabeça boa, esse atleta pode chegar na Seleção Brasileira e trazer bons frutos. É o que a gente quer. A gente pode criar uma grande história e, no final de tudo isso, poder sentar olhar olho no olho e falar que valeu a pena”, finalizou.

 

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