A redenção de Luan - Gazeta Esportiva
Bruno Ceccon
São Paulo, SP
12/28/2018 09:00:48
 

A temporada de 2018 foi de redenção para o zagueiro Luan. Antes cortado até do banco de reservas, o defensor ganhou espaço sob o comando do técnico Luiz Felipe Scolari e encerrou o ano como um dos destaques da zaga menos vazada do Campeonato Brasileiro.

Em entrevista exclusiva à Gazeta Esportiva, o zagueiro de 25 anos tomou o cuidado de reiterar seu respeito a Roger Machado, mas atribuiu a própria evolução a Felipão. “É um anjo que Deus colocou aqui dentro do Palmeiras para me ajudar”, afirmou o atleta, escalado em 24 jogos no ano.

O sorridente Luan mudou o semblante para explicar a atitude de assumir o vacilo cometido diante de Dario Benedetto no primeiro jogo contra o Boca Juniors, pela semifinal da Copa Libertadores. Ao falar sobre as perspectivas para o torneio continental, encarnou o espírito da torcida ao classificá-lo como “obsessão”.

O campeão olímpico também celebrou a parceria bem-sucedida com o paraguaio Gustavo Gomez no miolo de zaga e valorizou o trabalho do auxiliar Paulo Turra para acertar o sistema defensivo. Luan, como de costume, ainda manifestou gratidão ao Palmeiras por contratá-lo em recuperação de cirurgia.

Gazeta Esportiva: Você chegou ao Palmeiras como uma boa contratação, mas demorou um pouco a deslanchar.
Luan: Eu tinha feito uma cirurgia no Vasco e, quando cheguei ao Palmeiras, precisei passar por outra. Depois, quando comecei a jogar, não estava em um nível tão alto e a equipe também não fez um bom 2017. Nesse ano, comecei cheio de expectativa. Treinei muito nas férias para voltar bem, mas o treinador não optou por mim. Tenho total respeito pelo Roger (Machado), eram as escolhas dele. Sempre me preparei e, a partir do momento em que as oportunidades apareceram, pude ter uma sequência e mostrei meu potencial.

Gazeta Esportiva: Até enfim embalar, qual foi o momento mais difícil que você enfrentou no Palmeiras?
Luan: O período em que fiquei sem jogar. Em algumas partidas, cheguei a não ser relacionado, pela Libertadores. Vêm aquelas dúvidas, aquelas cobranças, as pessoas dizendo que você não é tão bom. Precisa ter equilíbrio na carreira. Quando não está jogando, dizem que você é ruim. Quando está jogando, dizem que é o melhor do mundo. Então, busco esse equilíbrio na carreira e na vida. Encontrei forças na família, nos amigos e em mim mesmo: olhar para dentro e saber que sempre fui capaz. Estou muito feliz por ver que tudo isso valeu a pena e honrado por ganhar um título de expressão, como o brasileiro.

Gazeta Esportiva: A sua volta por cima está diretamente relacionada com a chegada do Felipão.
Luan: Para mim, foi primordial. Um anjo que Deus colocou aqui dentro do Palmeiras para me ajudar. Um cara que chegou, confiou em mim, me abraçou e colocou para jogar. Não tenho palavras para descrever o carinho que tenho pelo Felipão. Respeito e admiração, sempre tive. Agora, lado a lado, a gente cria uma afinidade. Estou muito feliz por trabalhar com uma pessoa com a representatividade dele no mundo no futebol e espero prolongar essa jornada.

Gazeta Esportiva: Você chegou a jogar como capitão do Palmeiras em algumas partidas. Como começou essa relação de confiança com o Felipão?
Luan: O Paulo (Turra, auxiliar) assumiu contra o Bahia e não joguei. Contra o América-MG, o professor decidiu poupar os titulares, então calhou de minha oportunidade surgir logo no primeiro jogo dele. Pude disputar uma boa partida e acho que, a partir dali, a confiança foi se desenvolvendo nos treinos, com o comportamento e nos jogos. Você tem que deixar a alma nos 90 minutos. É isso que o Felipão gosta: que a gente dê a vida e se entregue dentro do campo. Foi tudo que fiz desde quando ele chegou. Antes, também fazia, mas não tinha tanta oportunidade.

Gazeta Esportiva: No primeiro jogo contra o Boca Juniors, pela semifinal da Copa Libertadores, o Benedetto marcou o segundo gol em cima de você. Depois da partida, você tratou de assumir a culpa. Naquele momento, teve algum receio de perder o espaço conquistado?
Luan: Não, nunca tive. Não posso entrar em campo com medo de perder espaço. Tenho que entrar pensando em aproveitar as oportunidades. Cometi um erro e assumi a responsabilidade. O cara também teve mérito e fez uma grande jogada. Mas, talvez, se eu tivesse parado na frente, ele não conseguiria girar em cima de mim. Não fiz mais do que minha consciência mandava, que era assumir a responsabilidade. Sempre dividindo com todo o grupo, porque ninguém ganha nem perde sozinho. Esse é meu caráter, sou assim e estou bem tranquilo. Consegui dar a volta por cima.

Gazeta Esportiva: Com essa postura, você acha que acabou ganhando pontos com o Felipão?
Luan: Juro que não fiz pensando nisso. Depois, ele me chamou e disse que não foi um erro meu, mas sim mérito do atacante do Boca. Fiz com a ideia de dar tranquilidade a mim e ao grupo e já focando o próximo jogo. Foi uma coisa de momento mesmo. Achei que tinha que assumir a responsabilidade e assumi.

Gazeta Esportiva: Após a eliminação contra o Boca Juniors, qual foi a sensação que ficou em relação ao torneio?
Luan: A gente fez uma bela campanha e acabamos caindo na semi. Ainda falta um tempo para a Libertadores e o momento agora é de pensar um pouco nas férias. Mas, sem dúvida, é um dos sonhos para o próximo ano. A torcida canta que é obsessão e é nossa obsessão também. Vamos trabalhar muito em cima disso para ver se conseguimos ganhar a Libertadores em 2019.

Gazeta Esportiva: Você e o Gustavo Gomez formaram uma dupla de zaga sólida. Como é jogar ao lado dele?
Luan: O Gustavo é um grande zagueiro. Provou isso ao chegar e se adaptar super rápido. O professor tomou essa decisão de manter as duas duplas, mas todos os jogadores do elenco têm qualidade. O Edu Dracena e o Antônio Carlos, quando atuaram, fizeram grandes jogos. Fico feliz pela parceria com o Gustavo. Temos bons números e vamos ver se conseguimos prolongar isso para o ano que vem. Independentemente de quem jogue, o importante é que o ambiente é bom. Todo o mundo se respeita e é isso que vale.

Gazeta Esportiva: Mas como essa dupla com o Gustavo deu certo tão rapidamente, mesmo sem o entrosamento ideal?
Luan: Eu tinha uma vontade muito de grande de vencer, de virar aqui dentro do Palmeiras e mostrar às pessoas que valeu a pena todo aquele investimento. Ele também chegou com bastante vontade, porque estava há um tempo sem jogar no Milan e querendo mostrar serviço. Então, foi uma vontade dupla de ajudar o Palmeiras e acabou dando certo.

Gazeta Esportiva: De que maneira o auxiliar e ex-zagueiro Paulo Turra contribuiu com a evolução do sistema defensivo?
Luan: O Paulo fica bastante com a gente. Sempre trabalha o setor defensivo, um ou dois dias antes dos jogos. É um cara enérgico, que jogou futebol e entende de posicionamento. Ele enfatiza a questão de estar sempre posicionado, sem desarrumar ali atrás. Foi um dos fatores primordiais para o título. Levamos poucos gols e estávamos sempre bem fechados. Então, o Paulo é um cara que chegou para ajudar muito, para agregar no posicionamento. Tem contribuído significativamente e espero aprender com ele cada vez mais.

Gazeta Esportiva: O Paulo Turra destacou muito a formação de uma identidade desde a chegada da nova comissão técnica. Como os jogadores viveram esse processo?
Luan: Desde que eles chegaram, nossa equipe criou uma maneira de jogar. Um time bem fechado, mas que, quando tem a bola, procurar ir para cima do adversário. Fazer um jogo muito de mano a mano com o Dudu, um cara que realmente chamou a responsabilidade desde a vinda do Felipão e fez a diferença. O Paulo sempre frisa essa identidade: dividir a bola como se fosse a última, entrar para jogar como se fosse a última partida da vida. A gente incorporou isso e esperamos manter a pegada para o ano que vem.

Gazeta Esportiva: Antes de deslanchar, você costumava falar sobre o desejo de retribuir ao Palmeiras por te contratar após uma cirurgia. Com o título brasileiro, sente que aplacou um pouco essa questão?
Luan: Não. Há um tempo, estava pesquisando os jogadores que foram contratados com lesão e não consegui achar muitos, ainda mais tendo que refazer uma cirurgia no pé. Foi um investimento alto do Palmeiras. Eu ainda tenho isso dentro de mim, essa vontade de retribuir, de devolver ao clube e à torcida um pouco do carinho que eles me deram. Vamos ver se conseguimos conquistar mais títulos para retribuir a confiança de todos, porque é isso que marca a trajetória de um jogador.

Gazeta Esportiva: Aos 25 anos, você tem contrato com o Palmeiras até o final de março de 2022. Terminando 2018 em alta, o que projeta para o futuro?
Luan: O desejo é me firmar cada vez mais no Palmeiras. Estou muito feliz e super adaptado. Gosto muito da cidade e do ambiente de trabalho. É um lugar em que você chega e as pessoas já te cumprimentam com um sorriso no rosto, desde o segurança até o presidente. Isso me deixa feliz e à vontade para trabalhar. O pensamento é dar a vida aqui e conquistar cada vez mais títulos. Para as outras coisas acontecerem, como Seleção Brasileira e, um dia, o sonho de jogar na Europa, você precisa fazer um grande trabalho no clube. Então, nem penso nisso agora. Penso em me firmar e evoluir cada vez mais.