Tua fama assim se fez - Gazeta Esportiva
Felipe Leite e Luca Castilho*
São Paulo, SP
08/26/2018 09:00:47
 

Diante de mais de 80 mil pessoas no Estádio Monumental Isidro Romero Carbo, em Guayaquil, o Vasco da Gama venceu o Barcelona do Equador por 2 a 1 e sagrou-se campeão da Copa Libertadores da América em 26 de agosto de 1998.

Exatos 20 anos depois, o feito ainda reverbera no Gigante da Colina. A ocasião marcou a primeira e única vez que o Cruzmaltino conquistou a principal competição continental sul-americana. Entretanto, o título não veio com facilidade: nas três primeiras partidas pelo torneio e atuando fora de casa, o Vasco foi derrotado pelo Grêmio e Chivas Guadalajara e empatou com o América-MEX.

Treinador daquela equipe, Antônio Lopes contou, com exclusividade à Gazeta Esportiva, que o início ruim não preocupava a comissão técnica. “Logo que a Libertadores começou, a equipe não estava bem entrosada ainda. Tivemos deslizes, mas é normal. Normal porque enfrentamos clubes de boa qualidade e não conseguimos a vitória.”

Mauro Galvão, capitão e um dos principais líderes do elenco, seguiu a mesma linha de seu técnico e direcionou atenção aos jovens atletas. “Foi uma amostra da dificuldade que a gente ia ter. Principalmente para os novos, que devem ter sentido um pouco esse começo, porque realmente, são jogos de um nível muito alto e são os melhores times de cada país. A dificuldade é natural”, afirmou à Gazeta Esportiva.

Recuperação

Com apenas um ponto conquistado, o Vasco recuperou-se na competição ao enfim iniciar sua campanha em São Januário: vitórias contra Grêmio e Chivas e novo empate com o América-MEX. Vice-líder do Grupo 2, o Gigante da Colina avançou com oito pontos somados e teve encontro marcado com o Cruzeiro, que defendia o título da disputa, pelas oitavas de final.

No embate nacional de mata-mata, a partida de ida não começou bem para o Cruzmaltino: em seus domínios, o time carioca viu o Cruzeiro abrir o placar em cobrança de pênalti de Marcelo. Entretanto, os tentos de Luizão e Donizete garantiram a virada dos comandados de Antônio Lopes. No confronto de volta, o 0 a 0 em pleno Mineirão carimbou a vaga vascaína nas quartas de final.

“A partida contra o Cruzeiro foi difícil, eles saíram ganhando, mas mesmo assim tivemos tranquilidade e viramos o jogo. Tínhamos um time bem equilibrado, com jogadores de força e qualidade para marcar. Essa forma de jogar que acabamos criando foi muito em função do Luizão e do Donizete”, disse o capitão vascaíno.

“Fomos crescendo depois que eliminamos o Cruzeiro. Contra o Grêmio, fizemos um grande jogo taticamente e fisicamente. Estávamos muito preparados”, falou o meia Ramon, peça fundamental daquela equipe, à Gazeta Esportiva.

Na fase seguinte, a equipe da Cruz de Malta enfrentou um rival já conhecido: o Grêmio. Depois de perder por 1 a 0 na fase grupos, em Porto Alegre, o Vasco segurou um empate por 0 a 0 na partida de ida das quartas em solo gaúcho. Na volta, o time comandado por Lopes conquistou um triunfo por 1 a 0, em São Januário, e carimbou vaga entre os quatro melhores da competição.

Embate contra o Bicho-Papão da América do Sul

Pelo caminho do clube, o próximo adversário seria o tradicional River Plate, então bicampeão da Libertadores (1986 e 1996). O placar mínimo obtido no Rio de Janeiro não dava garantias de vida fácil na Argentina. No icônico Monumental de Núñez, tal fato se confirmou: até os 36 minutos do segundo tempo, a vaga para a final seria decidida por meio de pênaltis, já que o River vencia por 1 a 0, com gol de Juan Pablo Sorín.

Surgiu, então, a estrela do jovem Juninho Pernambucano. Já perto da reta final de confronto, o meia bateu falta com perfeição, empatou a partida e garantiu a classificação do Vasco à final da Libertadores de 1998.

Contra o River, que era o Bicho-Papão da América do Sul, ganhamos e sentimos que poderíamos vencer o torneio – Antônio Lopes

“Se for analisar, nas oitavas eliminamos o Cruzeiro, então atual campeão. Nas quartas, nós eliminamos o Grêmio, que tinha sido campeão em 1995. E, por fim, nas semis, eliminamos o campeão da Libertadores de 1996, o River. Foram confrontos de gigantes e de equipes que, naquele momento, tinham um certo favoritismo até por conta disso”, analisou Ramon.

Final e título

Após enfrentar adversários de maior prestígio dentro do cenário sul-americano, o Gigante da Colina encarou o Barcelona de Guayaquil na grande decisão.

“O Barcelona de Guayaquil não chegou na final por acaso. Eles eliminaram adversários difíceis também e nós respeitamos muito eles. Sempre acreditamos. Chegamos muito fortes na decisão, por toda a campanha e todos os rivais que enfrentamos. Foram dois grandes jogos na final, mas tivemos um respeito muito grande pelo adversário”, ressaltou o meia.

A primeira partida, realizada no caldeirão de São Januário, foi disputada. Ao apito final do árbitro uruguaio Gustavo Mendéz, o Vasco ia para o Equador com uma boa vantagem na bagagem: vitória por 2 a 0, decretada por gols de Donizete e Luizão.

Foi um jogo muito tático, a gente jogava e ao mesmo tempo tomava cuidado para não levar gol – Mauro Galvão

Em Guayaquil, no dia 26 de agosto de 1998, o Cruzmaltino conquistou novo triunfo, dessa vez por 2 a 1, e levantou a taça mais cobiçada do futebol sul-americano. Novamente, a dupla de ataque vascaína, formada por Donizete e Luizão, foi decisiva para o resultado.

“Senti alívio, vontade de extravasar, gritar. Foi uma alegria muito grande. A Libertadores é muito difícil, tinha sido vice-campeão com o Internacional, joguei pelo Grêmio também e de novo fiquei no ‘quase’. Já estava com 36 anos e aquele era o momento de ganhar, assim como outros também pensaram da mesma forma: era hora do Vasco ser campeão”, revelou o experiente zagueiro, com 36 anos à época.

Foi o título mais importante da minha carreira – Ramon

O delegado motivador

Antônio Lopes e sua eterna camisa de linho verde (Foto: Acervo/Gazeta Press)

Com 56 anos à altura, Antônio Lopes estava em sua quarta passagem pelo Vasco e já havia acumulado inúmeras experiências, inclusive fora do país. Em 1997, o delegado conduziu a equipe carioca ao título Brasileiro e na temporada seguinte, conseguiu o maior título da história do clube: a Libertadores.

“O Antônio Lopes foi muito importante. Ele soube conduzir o grupo e controlar os jogadores, o que não é fácil. Não dá para dizer que o grupo às mil maravilhas porque sempre tinha alguma coisinha, mas comparando com hoje, era um time muito tranquilo”, afirmou Mauro Galvão.

“O Lopes teve uma felicidade muito grande de motivar muito todos os jogadores. Futebol gira muito em torno de resultado e aquele time teve resultado. Por isso que nós, naquele momento, conseguimos as conquistas. Antônio Lopes é um disciplinador, um cara que trabalha muito. Ele fez com que cada um dos jogadores entendesse o que é trabalho, que futebol é coisa séria, é dedicação”, embasou o meia Ramon.

O treinador recusa o rótulo de protagonista e credita o sucesso na campanha da Libertadores de 98 a outro fator: sua camisa de linho verde, eternizada em seu armário.

“Durante o Brasileiro de 97, nós também começamos mal, com três jogos iniciais negativos. Já no quarto jogo, vencemos o São Paulo e eu tinha usado uma camisa de linho verde, manga comprida. No jogo seguinte, usei novamente e ganhamos. Continuamos ganhando e nos sagramos campeões brasileiros daquele ano. A camisa se eternizou aí!”, explicou Lopes.

Depois de 20 anos da conquista do título, o verdadeiro troféu encontra-se na casa do delegado motivador. “Eu ainda guardo essa camisa comigo. Já está velhinha, está até rasgada, mas foi muito importante. É um troféu para mim!”

Especial para a Gazeta Esportiva