Nem Pelé convenceu: a história de um corintiano contada em pôsteres de jornais - Gazeta Esportiva
Marina Bufon
São Paulo
09/01/2022 07:00:36
 

“A rua Javari inteira estava vaiando o Pelé naquele jogo em 1959, contra o Juventus. Eu estava lá, tinha nove anos, com o meu pai, fui um dos que vaiei. O Pelé foi lá, driblou todo mundo e fez aquele gol antológico. Mas, para mim, até hoje, Ney é melhor que Pelé… E que Coutinho também”.

Mesmo com o pai santista, o avô palmeirense e a madrinha são-paulina, além de ter visto Pelé ao vivo e a cores fazendo o gol que não foi filmado, Luiz Mello é torcedor do Corinthians, que, nesta quinta-feira, comemora 112 anos de existência. O motivo? Nem mesmo ele sabe.

Luiz Mello, 8 anos – “Meus pais me deram o uniforme, minha avó a bola e a madrinha as chuteiras. Fui jogar na rua e não me deixaram usar as chuteiras, porque só se jogava descalço”. (Foto: Arquivo pessoal)

“Não sei de onde nasceu. Pela minha idade, nasci na era do Pelé, só posso dizer que foi paixão. Eu tinha quatro anos quando o Corinthians foi campeão em 1954, meu tio me levava no bar para falar o time do Corinthians. Não sei da onde que surgiu”, disse em entrevista à Gazeta Esportiva.

Nascido na zona leste de São Paulo, o engenheiro aposentado, hoje aos 72 anos, já morou em diversos lugares do Brasil por conta do trabalho. E sempre levou as cores preta e branca por onde passou.

“Eu levo o Corinthians para todo lugar que vou e passo essa paixão. Posso dizer que cumpri minha missão na Terra: plantei uma árvore, escrevi um livro e fiz uma filha corintiana”, brincou.

Maria Fernanda mora na Espanha e, quando foi visitá-la, assistiu até mesmo a Paulinho fazendo gol pelo Barcelona, no Camp Nou, o mesmo Paulinho que tantas vezes seu Luiz já viu dar alegrias ao Timão.

“Sofri os 23 anos de jejum, mas, depois, vi todas as conquistas. Nunca estive no estádio em dia de título, sou muito emotivo, me preservo”, falou aos risos. Em 2012 eu assisti pela televisão, porque a Maria Fernanda foi para o Japão e queria vê-la por lá também”.

Seu Luiz contou que a filha trouxe do outro lado do mundo, junto com o título do Mundial, uma camisa do Corinthians, com escritos em japonês. Trajado com manto alvinegro, ele foi até a Igreja de São Judas Tadeu, no bairro do Jabaquara, em São Paulo, para pagar a promessa do título conquistado.

“Eu já tinha feito isso em 76, contra o Fluminense, na Invasão. Em 2012, fiz (a promessa) para agradecer. Aí fui com a camisa do Corinthians, comprei uma vela do meu tamanho (1,75m). Quando fui atravessar a rua, uma japonesa bem idosa, começou a ler ‘Corinthians’. Era isso que estava escrito, eu nem sabia, só vesti. Era do Corinthians”, falou.

Outra história que guarda com carinho foi na conquista do Mundial, em 2000. Ele estava em Manaus, a trabalho, com duas horas de diferença de fuso-horário.

“Não queria ver aquele jogo. Saí da república onde morava procurando um lugar tranquilo, todas as televisões ligadas no jogo. Eu queria me isolar, não queria sofrer. Fui para onde? Me escondi num cemitório, 9 horas da noite. Quando deu o horário, liguei para a minha mulher e ela me disse: está nos pênaltis, se fizer agora, o Corinthians vai ser campeão. Foi o que aconteceu, e dancei sozinho na rua”, contou.

Seu Luiz já assistiu ao clube do coração no Parque São Jorge, Pacaembu, Morumbi e Maracanã, mas, paradoxalmente, nunca esteve na Arena, que sempre lota com tantos corintianos desde sua inauguração, em 2014.

“É meu sonho entrar lá, mas confesso que sou um pouco acomodado. Eu era até sócio. Voltei para São Paulo em 2017 e, desde então, só passo de carro e não entro”, comentou.

Todas essas histórias de seu Luiz Mello não ficam apenas na memória, que ainda está bastante em dia. Seis pastas, de 50 folhas cada, guardam milhares de histórias, com pôsteres e matérias de todos os títulos do Corinthians de 1977 para frente, além de todas as conquistas estaduais, até mesmo anteriores.

Foto e A Gazeta Esportiva, de 1954, em homenagem ao Corinthians campeão paulista, que também celebrava o IV Centenário de São Paulo (Foto: Arquivo pessoal)

“Tem Gazeta Esportiva, LANCE!, revista Placar, Manchete Esportiva, que nem existe mais, Tabloide Coração, que era feita por corintianos. Uma vez, quando estava trabalhando em Manaus, minha mulher mandou pelo Correio o pôster do título brasileiro de 99 e do Mundial de 2000. Todo mundo da obra, a maioria corintiano, foi ver o pôster”.

Para seu Luiz, o Corinthians não é só parte da vida, é, também, sua história e seu amor. O time o ajudou na cura da depressão.

“Quando minha filha, que morava com a gente, resolveu se mudar para outro país, entrei em depressão. Sabe como melhorei? Com o Corinthians ganhando o Paulista e, depois, o Brasileiro (em 2017). Fui ao psiquiatra, sim, mas quem me curou foi o Corinthians”, disse aos risos.

Luiz Mello segue firme e forte na torcida pelo Corinthians, comemorando seus 112 anos (72 deles divididos com a vida dele mesmo) nesta quinta-feira.

Ele ainda perguntou, como todo bom corintiano, algumas informações de bastidores (“isso é verdade? Mas e aquilo que falaram? O fulano é brigado com sicrano mesmo?”), mas, como também todo bom corintiano, sempre apoia o clube.

“Não importa quem veste a camisa. Se é este, se é aquele. Vestiu a camisa do clube, tenho que acreditar que é bom, tenho que confiar”, finalizou.