Gol de goleiro - Gazeta Esportiva
Bruno Ceccon
São Paulo, SP
12/02/2020 07:00:37
 

Acostumado a usar as mãos, Fernando Buttenbender Prass, ironicamente, entrou para a história da Sociedade Esportiva Palmeiras com o pé direito. Há exatos cinco anos, contra o rival Santos, o já experiente goleiro decidiu bater um pênalti pela primeira vez na carreira e garantiu o título que enfim recolocou o clube alviverde entre as potências do cenário nacional.

“Como a gente treinava pênaltis com o Marcelo Oliveira praticamente todos os dias, mesmo não tendo decisões, eu passei a treinar também. Na minha cabeça, era mais ou menos o seguinte: queria estar preparado e, caso não precisasse, não fazia mal, mas, se precisasse, estaria pronto para cobrar. E comecei a bater bem”, contou Prass à Gazeta Esportiva em novembro de 2018, ao lado do gol em que o título foi decidido, no Allianz Parque.

Duas partidas disputadas em 2015 influenciaram o então palmeirense a treinar as cobranças. Pela semifinal do Campeonato Carioca, o Botafogo eliminou o Fluminense (9 x 8) nos pênaltis e, na segunda fase da Copa do Brasil, o Coritiba superou o Fortaleza (11 x 10). Nas duas ocasiões, avançaram os times cujos goleiros foram capazes de converter as respectivas cobranças.

“Na chegada ao estádio, o auxiliar do Marcelo perguntou: ‘Prass, se tiver pênalti, você vai bater?’. Então, eu respondi: ‘Não, não. Não vai ter pênalti’. Mas teve. Quando chegamos no grande círculo para escolher os batedores, estava uma bagunça. Para ter uma noção, o Alecsandro, que não estava nem inscrito na Copa do Brasil, ficou do lado do Marcelo Oliveira para ajudar a escolher os cobradores”, recordou.

Contratado em junho de 2015, Alecsandro já havia disputado a Copa do Brasil pelo Flamengo e, portanto, não podia defender o Palmeiras no mesmo torneio. Em um diálogo com o centroavante, um de seus amigos mais próximos no elenco, Fernando Prass soube que seria o encarregado de cobrar o quinto pênalti da série contra o Santos.

“Perguntaram para mim: ‘Tu bate?’. Eu respondi: ‘Bato’. Aí, o Alecsandro falou: ‘Prass, conversei com o Marcelo e tu vai bater o quinto’. Falei: ‘Beleza’. A gente tinha alguns meninos em campo. O Gabriel havia saído, o Cleiton Xavier não estava jogando. Então, não estávamos com muitos jogadores experientes para cobrar. O Vitor Hugo estava chegando no Palmeiras”, lembrou o goleiro, já com 37 anos e um dos líderes do elenco.

“Se eu deixasse na mão dos meninos, que, de repente, até cobravam melhor, já que eu nunca tinha batido um pênalti na vida, e um deles errasse, ficaria com a consciência pesada de não ter assumido a responsabilidade, pela experiência, idade e tempo de clube. Dizem: ‘Ah, o Prass foi maluco de bater’. Maluco, não, tanto que treinei muito. Se não estivesse preparado, não bateria. Mas foi uma situação muito difícil”, lembrou.

Até a cobrança de Fernando Prass, Zé Roberto, Jackson e Cristaldo haviam convertido pelo Palmeiras, com uma falha de Rafael Marques. Pelo Santos, Geuvânio, Lucas Lima e Ricardo Oliveiram marcaram, mas Marquinhos Gabriel e Gustavo Henrique perderam. Com a chance de garantir o título da Copa do Brasil, o goleiro surpreendeu até o árbitro da partida.

“O Ricardo bateu o pênalti, a bola saiu e o Héber (Roberto Lopes) pegou na mão. Fui para o lado do Héber e ele tirou a bola de mim. Então, falei: ‘Não! Sou eu! Dá aqui! Sou eu que bato!’. Ele disse: ‘É tu?!’. Estava ruim para cobrar ali. O Scarpa escorregou na semi e o Marquinhos, na final. Eu já estava com uma chuteira especial, de trava maior. Como fui o 10º, o pênalti estava muito mexido. Eu bato forte, então tinha que ter cuidado para não isolar”, explicou.

Aos 37 anos, com uma responsabilidade inédita, Prass foi decidido a cobrar exatamente da maneira que treinava na Academia de Futebol. Em seu primeiro pênalti na carreira, o goleiro mirou o canto esquerdo de Vanderlei e viu o santista saltar para o lado oposto. Assim, de forma improvável, o Palmeiras conquistou o primeiro título no Allianz Parque e consolidou seu ganho de terreno após quase cair novamente no Brasileiro 2014.

“Foi uma descarga de adrenalina absurda. Tanto que saí correndo, corri, corri… Dei a volta, fui lá na torcida. Em um momento, pareceu que a energia acabou e caí no chão, só queria respirar. Por uns dois ou três minutos, não conseguia pensar em nada. Meu cérebro não raciocinava e só podia extravasar a adrenalina. Acho que só vou ter a real dimensão disso tudo quando parar e vir aqui com meu filho assistir um jogo”, afirmou.

Ganhador da Série B do Campeonato Brasileiro 2013 e das edições de 2016 e 2018 da Série A, além da Copa do Brasil 2015, Fernando Prass disputou um total de 274 partidas pelo Palmeiras – entre os goleiros, ocupa o oitavo posto na história. Após deixar o clube alviverde a contragosto no fim de 2019, acertou com o Ceará, pelo qual conquistou a última Copa do Nordeste.