Cinco vitórias inesquecíveis de Ayrton Senna - Gazeta Esportiva
Lorenzo Meyer*
São Paulo, SP
04/29/2019 08:30:55
 

A memória deixada pelos feitos de Ayrton Senna ao longo das 161 corridas em que participou na Fórmula 1 sempre continuará encantando os amantes do automobilismo mundial, sobretudo os brasileiros. Nem mesmo os 25 anos da morte do piloto, que serão completos no próximo dia primeiro de maio, impedem os mais novos de conhecer as realizações marcantes de uma trajetória para lá de vitoriosa.

Aos que viram Ayrton Senna e aos que não tiveram esse prazer, a Gazeta Esportiva elege cinco vitórias do piloto a fim de relembrar momentos históricos de um brasileiro que orgulhou seus compatriotas e tem a admiração de todo o mundo na arte de guiar um carro de Fórmula 1.

A primeira bandeira quadriculada

Ayrton Senna, Alain Prost, Nigel Mansell e Nelson Piquet no GP de Portugal (Foto: AFP)

GP de Portugal, em 21 de abril de 1985. Era um domingo chuvoso no autódromo de Estoril, quando Ayrton Senna pôde realizar um dos maiores sonhos de sua vida. O piloto, com 25 anos na época e tido como uma das principais revelações da F1, recebia a bandeira quadriculada ao cruzar a linha de chegada na frente pela primeira vez.

Após abandonar a corrida de Interlagos, duas semanas antes, Senna chegava desacreditado na corrida, mas tratou logo de mostrar toda a sua habilidade no treino classificatório, onde cravou o melhor tempo e ficou com a pole position, a primeira das 65 que conquistou ao todo.

No domingo, porém, um temporal caiu na pista, transformando a corrida em um grande desafio para os pilotos. Mesmo em sua segunda temporada na categoria, Senna mostrou toda sua segurança para guiar a Lotus no piso escorregadio. Com a tranquilidade de um veterano, o brasileiro liderou do começo ao fim e confirmou a vitória inicial na categoria.

De pneu careca e tudo

Pódio do GP da Espanha de 1986 foi composto por Senna, Mansell e Prost (Foto: Daniel JANIN e Pascal PAVANI / AFP)

O GP da Espanha no circuito de Jerez de la Frontera, em 1986, reservou a Ayrton Senna um dos mais emocionantes triunfos de sua carreira. Contra as Williams de Nigel Mansell e Nelson Piquet e as McLaren de Alain Prost e Keke Rosberg, o piloto da Lotus voou baixo e fez mais uma vez a pole position, a nona até então.

Durante a prova, o brasileiro trocou ultrapassagens com Mansell na luta particular pela liderança. Ao todo, Senna andou na frente durante 49 voltas, já o britânico, por outras 23. Diante de tamanho equilibrado, o vencedor seria quem conseguisse administrar o desgaste dos pneus e o consumo de combustível.

Senna esteve na ponta até a volta 39, quando foi deixado para trás por Mansell. O britânico, no entanto, sofreu com a deterioração de seus pneus e por isso decidiu ir aos boxes. Para tentar a vitória, o brasileiro da Lotus optou por ficar na pista. Faltando nove voltas, o piloto Williams chegou a tirar 20 segundos, enquanto Ayrton se desdobrava para seguir no asfalto.

Com o roteiro montado, a Fórmula 1 viu uma das chegadas mais emocionantes da história naquele 13 de abril de 1986. No cotovelo que leva à reta de chegada em Jerez, os carros mergulharam juntos e cruzaram a linha de decisiva lado a lado. Ninguém comemorou a vitória, até que a organização anunciou pelos alto-falantes que Senna havia cruzado com 14 milésimos de segundo à frente de Mansell.

Vitória e de quebra o primeiro título mundial

Ayrton Senna ao lado de Alain Prost em 1988, ano em que o brasileiro conquistou seu primeiro título mundial (Foto: AFP)

Em 1988, Ayrton Senna fazia primeira temporada na McLaren. Ao lado do companheiro de equipe Alain Prost, o brasileiro formou o que era chamado de “Dream Team” e disputou ponto a ponto o título. Com sete vitórias do sul-americano contra seis do europeu em 14 corridas, Senna precisava de mais um triunfo no GP do Japão, o penúltimo da temporada, para levar o caneco pela primeira vez.

Senna, claro, já queria garantir logo a conquista em solo japonês e desde os treinos livres dominou o rival. Sem baixar o ritmo, o brasileiro cravou o melhor tempo no classificatório e fez a 12ª pole no ano, a melhor marca da F1 até então. Quando as luzes verdes da largada acenderam, Ayrton levou um susto: o carro não saiu do lugar e ele, em ato reflexo, ergueu os braços sinalizando o problema na esperança de não levar nenhum toque dos mais de 20 pilotos que estariam atrás dele.

Por sorte, o carro de Senna ficou intacto e o grid era localizado em uma descida, facilitando para que ele “desse um tranco”. Nessa altura, porém, já havia perdido 16 posições e Prost assumiu a ponta. Só uma corrida impecável, improvável e inimaginável faria Ayrton campeão em Suzuka. E foi exatamente isso que aconteceu.

Determinado, Senna correu de forma agressiva, acumulou ultrapassagens e logo colou no pelotão da frente. No final da décima volta, quando começou a garoar, só havia um carro entre ele e Prost: a March de Ivan Capelli, que sucumbiu na 20ª passagem pela linha de chegada, momento que a chuva cessou. Aparentemente ela só apareceu para proporcionar uma disputa alucinante entre os dois grandes pilotos.

Em uma prova à parte entre a dupla da McLaren, Ayrton foi aos poucos encostando em Prost até que a 21 voltas do fim aconteceu o improvável. Voando na pista, o brasileiro armou o bote na entrada da reta dos boxes para fazer a 15ª e mais espetacular ultrapassagem na corrida. O francês espremeu Senna no muro, mas não foi o suficiente para impedir a magistral ultrapassagem.

Ayrton não baixou o ritmo, abriu para o rival e venceu o histórico GP do Japão de 30 de outubro de 1988, que lhe rendeu o primeiro título na F1. A corrida de Senna no Japão é tida até hoje como umas melhores aparições de um piloto na história da categoria. Assim, restou ao brasileiro fazer a festa diante de asiáticos atônitos nas arquibancadas do circuito diante de tamanha performance.

Faltava ganhar em casa…

Senna venceu a primeira no Brasil em 1991 (Foto: Jean-Loup GAUTREAU and Pascal PAVANI / AFP)

Na temporada de 1991, Senna já era um piloto consagrado ao somar dois títulos e ter inúmeras apresentações relevantes, mas ainda faltava um triunfo pessoal: vencer em Interlagos. E foi no melhor estilo Ayrton que o brasileiro alcançou o feito. Após largar na pole, ele liderou sem dificuldades até a 65ª volta.

De repente, a marcha escapou, Senna tentou engatar outra, porém o câmbio havia quebrado. Restava ao brasileiro fazer o motor não morrer e acelerar ao máximo para que o italiano Riccardo Patrese, da Williams, não chegasse. Para piorar, ou melhorar no caso de Ayrton, começou a chover.

Faltando seis voltas, os problemas foram se agravando e Senna se superou para guiar o carro até a linha de chegada. Seu esforço foi tão grande que o piloto, completamente exausto, não conseguiu sair do veículo. Exaurido, Ayrton juntou o que restou de suas forças para levantar o troféu da tão sonhada vitória diante de seu povo.

“Faltando 20 voltas para o final eu tive problemas graves com o câmbio: perdi as terceira e quinta marchas e de repente usava somente a sexta nas últimas sete voltas. Eu notei o Patrese se aproximando de mim e cheguei a pensar que não venceria. No entanto, senti que tinha obrigação de vencer aqui no Brasil e assim consegui levar o carro apesar da chuva que caiu no final da corrida”, disse Senna após a prova em 24 de março de 1991.

“Eu ainda tive espasmos musculares e câimbras nos ombros e pescoço porque o cinto de segurança estava muito apertado, mas também por causa da emoção”

A melhor volta de todos os tempos

Senna se preparando para entrar no carro da McLaren (Foto: PATRICK KOVARIK / AFP)

Foi em Donington Park, na pequena cidade de Castle Donington, na Inglaterra, que Senna fez seu primeiro teste com um carro de Fórmula 1 em 1983. E seria ali que o brasileiro faria uma de suas maiores corridas na carreira dez anos depois, no único GP da categoria que o autódromo recebeu em toda a história.

No treino classificatório de sábado, a Williams, que voava na época, mostrou que a tarefa de Ayrton seria complicada ao levar as duas primeiras posições com Alain Prost e Damon Hill. Para piorar a situação, a jovem revelação Michael Schumacher fez o terceiro tempo e jogou o brasileiro para quarto.

O domingo amanheceu nublado, com chuva e frio, tipicamente inglês. A largada do brasileiro foi nesse mesmo estilo: nebulosa. Bloqueado por Schumacher, Senna viu Karl Wendlinger aproveitar e roubar a quarta posição. Foi aí que começou o show de Ayrton que entraria para a história.

Logo na curva seguinte, Senna deixou Schumacher pelo caminho sem a menor dificuldade e já colou em Wendlinger. Buscando um traçado diferente mesmo com chuva, Ayrton ultrapassou o austríaco e pisou fundo para encostar em Hill, que viu o brasileiro arriscar por dentro no arco e assumir a segunda colocação.

Prost, porém, parecia muito afastado para Senna buscar a ponta ainda na primeira volta. Sem desistir, o brasileiro seguiu com o pé no acelerador e, na curva mais lenta do circuito, postergou a freada para passar o inglês e assumir a dianteira. A partir disso, ficou fácil para Ayrton vencer o GP da Europa de 11 de abril de 1993.

*Especial para a Gazeta Esportiva



×