Cabeça fria, coração quente e respiração consciente - Gazeta Esportiva
Felipe Leite
São Paulo, SP
05/20/2023 06:00:24
 

“Veja os vídeos da monja que você está muito nervoso.” Foi assim que, quando estava no Braga — clube português que treinou até 2019 —, Abel Ferreira conheceu a Monja Coen Rōshi. A dica, dada por uma das psicólogas do time, ficou impregnada na mente do atual técnico do Palmeiras.

O combate à ansiedade já é luta antiga para o comandante alviverde. Contra o RB Bragantino, Abel tomou seu 48º cartão desde o início da passagem no futebol brasileiro — com isso, está suspenso para o clássico deste sábado, diante do Santos, pela 7ª rodada do Campeonato Brasileiro.

Justamente para tentar controlar os ânimos, pois, o português visitou o Templo Taikozan Tenzuizenji, da Comunidade Zendo Brasil, em São Paulo, para falar com a Monja Coen. No fim de agosto do ano passado, Abel reuniu a esposa e suas duas filhas e foi ao encontro de sua referência.

“Foi uma bênção (a visita ao templo). Quando ele estava lançando esse livro maravilhoso “Cabeça Fria, Coração Quente”, eu estava lançando um livro também na Bienal do Livro. Nós não nos encontramos na Bienal, mas os editores passaram o meu livro pra ele, o dele pra mim — e combinaram dele me visitar, porque ele quis me visitar. Ele disse que me conhecia de Portugal”, relatou a Monja Coen, com exclusividade à Gazeta Esportiva.

Ele veio com a esposa, com as duas filhas lindas e ele quis fazer meditação, sentaram em meditação e conversamos uma hora, uma hora e pouco. Foi muito agradável

O encontro deu início a uma relação entre Monja Coen e Palmeiras. Mesmo com uma infância corintiana — o fato de ter crescido em uma casa praticamente à frente do Estádio do Pacaembu colaborou muito para isso —, Rōshi criou grande identificação com o clube alviverde e com o próprio técnico.

Exemplo claro disso foi quando ao receber a reportagem da Gazeta Esportiva em um dos camarins do Teatro Gazeta, antes de uma palestra no local, Monja Coen bradou ‘Avanti Palestra’ com muito, muito entusiasmo.

“Eu respeito muito o Abel. Acho que todos nós, né? Nós todos estamos vendo a capacidade que ele tem de trabalhar com essa equipa, como ele fala (risos). A equipa em primeiro lugar. Mais do que talento, é caráter. Ele ensina honra, tem um código de honra, é uma coisa maravilhosa. Muito correto e é nervoso, claro, porque tem que ter coração quente. Se ele não é um técnico de futebol, diz: ‘ah, fizeram errado, não falo nada’. Tem que falar, brigar”, afirmou.

(Foto: Divulgação/Cesar Greco)

Em uma entrevista coletiva recente, Abel reconheceu que precisa mudar o comportamento. Mas deu a letra: o foco da imprensa precisa parar de ser um pouco referente à consequência e passar a tratar da causa. Exemplo? O cartão amarelo contra o RB Bragantino foi aplicado por reclamação — motivada por Savio Pereira Sampaio não marcou pênalti de Cleiton em Endrick.

Mas mesmo em situações de injustiça, perseguição, o que seja: como fazer com que a temperatura do coração implique somente em motivação ao elenco? Como controlar os ânimos de maneira mais efetiva?

“Respiração consciente. Fizemos no templo, mas foi muito pouquinho, né? É um tempo limitado, ele não tem tempo de ficar meditando, nem de ficar frequentando a comunidade, mas uma coisa que ele pode fazer: respirar. Percebeu que aquela energia, aquela coisa quente está vindo? Sente, sente, sente — que é bom sentir isso — e respira fundo. ‘O que eu faço agora? Como eu falo isto? Como eu me manifesto?’ Mas isso é treino, é como tudo. É treino e a gente erra inúmeras vezes — até que a gente acerta. E a esposa dele confia nisso. Ela tem até umas uns truquezinhos que faz com ele né? Para colocá-lo nesse eixo de equilíbrio”, analisou Monja Coen.

Porque ele é maravilhoso, mas talvez o que faça dele mais maravilhoso é que ele é quente. E dizer pra ele esfriar… pode ser que deixe de ser esse grande técnico que ele é. Que seja como ele é e a gente seja capaz de amá-lo, querê-lo bem e respeitá-lo como ele é. E ele pode muito bem treinar seus jogadores e não precisa estar olhando o jogo diretamente. Ele pode estar lá atrás e as pessoas que trabalham com ele estão dando as orientações dele

O ponto enfatizado por Monja Coen é: mesmo que não consiga controlar a ansiedade, o nervosismo no calor do jogo, Abel vai ficar bem.

“Ele toma muitos cartões, mas tudo bem. A gente tem que se manifestar no mundo, a gente não pode se calar. Se você ver uma coisa errada, você vai ficar quietinho, sentadinho num canto? Se manifeste. E se essa manifestação é entendida dessa forma, que ele não pode se manifestar, eu não sei por que não poderia. Claro, ele não precisa chutar as coisas longe, né? Às vezes ele passa do limite. Mas dá pra entender. Eu acho que por isso é que formou essa liga com os jogadores. Porque eles se identificam: são jovens que também teriam vontade de gritar, xingar, mas se controlam. E o treinador dele está lá por eles, está lutando por eles, então é uma pessoa confiável. Não é uma pessoa que está lá pra fazer uma campanha política, para dizer: ‘eu vou treinar outro time de futebol’. Já recebeu convites e recusou. Ele é lindo, maravilhoso. Eu falo que sou ‘Abelense’ (risos)”, brincou.

Depois de receber o português no Templo, a Monja Coen recebeu convite para assistir jogo no Allianz Parque neste ano — viu o Verdão derrotar a Ferroviária por 2 a 1, no Campeonato Paulista — e chegou a, posteriormente, dar entrevista para o podcast oficial do clube alviverde.

O acalorado ‘Abel Ferreira Futebol Clube’, definitivamente, conquistou o calmo e compenetrado coração de Coen Rōshi.

“Há muitos e muitos e muitos e muitos anos — mais de cinquenta ou sessenta — que eu não ia assistir um jogo no campo. Como é lindo. É outra visão. A câmera de televisão limita um pouco, né? Porque ela fica muito onde está a bola. E de repente você vê toda aquela imensidão. E aquele hino nacional do Palmeiras, que é isso? (risos). Que bonito, eu não sabia que existia. Fiquei maravilhada. Me deram umas comidinhas boas, me deram um hot dog, pipoca. Foi muito lindo, muito bonito. O campo é imenso. A torcida é maravilhosa, que coisa linda e poder ver, por exemplo, o goleiro do Palmeiras — que às vezes não tinha o que fazer no jogo — indo e voltando do meio de campo… coisas que a gente não vê, né?”, disse, com brilho nos olhos.

Eu estava olhando o Abel e vendo como é que ele estava se manifestando, como é que estava a comissão técnica. Tem uma visão maior. Eu acho que isso é importante. A meditação, o zen tem isso: expande a consciência, vê grande a coisa, não vê pequenininho. Eu acho que o Abel é grande e por isso dá certo

Confira todos os cartões que Abel Ferreira recebeu em sua passagem no futebol brasileiro:

Copa do Brasil 2020
Um cartão amarelo e um cartão vermelho direto:
– Palmeiras x Ceará (11/11/2020): cartão vermelho direto
– América-MG x Palmeiras (30/12/2020): cartão amarelo

Brasileirão 2020
Três cartões amarelos:
– Goiás x Palmeiras (21/11/2020): cartão amarelo
– Inter x Palmeiras (19/12/2020): cartão amarelo
– São Paulo x Palmeiras (19/2/2021): cartão amarelo

Libertadores 2020
Dois cartões amarelos:
– Palmeiras x Libertad (15/12/2020): cartão amarelo
– River Plate x Palmeiras (5/1/2021): cartão amarelo

Supercopa do Brasil 2021
Um cartão amarelo e um cartão vermelho direto:
– Flamengo x Palmeiras (11/4/2021): cartão amarelo e cartão vermelho direto

Paulistão 2021
Dois cartões amarelos:
– Red Bull Bragantino x Palmeiras (14/5/2021): cartão amarelo
– Palmeiras x São Paulo (20/5/2021): cartão amarelo

Brasileirão 2021
Seis cartões amarelos e um cartão vermelho direto:
– Palmeiras x Bahia (27/6/2021): cartão amarelo
– Internacional x Palmeiras (30/6/2021): cartão amarelo
– Atlético-GO x Palmeiras (18/7/2021): cartão amarelo
– Atlético-MG x Palmeiras (14/8/2021): cartão amarelo e cartão vermelho direto
– Palmeiras x Red Bull Bragantino (9/10/2021): cartão amarelo
– Fortaleza x Palmeiras (20/11/2021): cartão amarelo

Libertadores 2021
Três cartões amarelos:
– Palmeiras x Independiente del Valle (27/4/2021): cartão amarelo
– Atlético-MG x Palmeiras (28/9/2021): cartão amarelo
– Palmeiras x Flamengo (27/11/2021): cartão amarelo

Paulistão 2022
Quatro cartões amarelos:
– Palmeiras x Santo André (19/2/2022): cartão amarelo
– Palmeiras x Guarani (6/3/2022): cartão amarelo
– Palmeiras x Red Bull Bragantino (26/3/2022): cartão amarelo
– São Paulo x Palmeiras (30/3/2022): cartão amarelo

Recopa Sul-Americana 2022
Um cartão amarelo e um cartão vermelho direto:
– Palmeiras x Athletico-PR (2/3/2022): cartão amarelo e cartão vermelho direto

Libertadores 2022
Um cartão amarelo:
– Palmeiras x Atlético-MG (10/8/2022): cartão amarelo

Brasileirão 2022
Oito cartões amarelos e um cartão vermelho direto:
– Palmeiras x Ceará (9/4/2022): cartão amarelo
– Palmeiras x Fluminense (8/5/2022): cartão amarelo
– Juventude x Palmeiras (21/5/2022): cartão amarelo
– Palmeiras x Atlético-MG (5/6/2022): cartão amarelo
– Palmeiras x Athletico-PR (2/7/2022): cartão amarelo
– Palmeiras x Santos (18/9/2022): cartão amarelo e cartão vermelho direto
– Botafogo x Palmeiras (3/10/2022): cartão amarelo
– Palmeiras x São Paulo (16/10/2022): cartão amarelo

Mundial de Clubes 2022
Um cartão amarelo:
– Chelsea x Palmeiras (12/2/2022): cartão amarelo

Paulistão 2023
Três cartões amarelos:
– Botafogo-SP x Palmeiras (19/1/2023): cartão amarelo
– Água Santa x Palmeiras (12/2/2023): cartão amarelo
– Palmeiras x Ituano (19/3/2023): cartão amarelo

Supercopa do Brasil 2023
Um cartão amarelo e um cartão vermelho direto:
– Palmeiras x Flamengo (28/1/2023): cartão amarelo e cartão vermelho direto

Brasileirão 2023
Três cartões amarelos e um cartão vermelho direto:
– Palmeiras x Cuiabá (15/4/2023): cartão amarelo e cartão vermelho direto
– Palmeiras x Corinthians (29/4/2023): cartão amarelo
– Palmeiras x RB Bragantino (13/5/2023): cartão amarelo

Libertadores 2023
Um cartão amarelo:
– Bolívar x Palmeiras (5/4/2023): cartão amarelo