De bem com a vida - Gazeta Esportiva
Tomás Rosolino
São Paulo (SP)
05/30/2018 06:39:20
 

Poucos meses depois de perder uma das suas maiores revelações da década, o Corinthians tem um dono na lateral esquerda. Mas nada programado, idealizado pelas categorias de base do clube ou captado por meio de extensas pesquisas do departamento de futebol. Contratado em um momento de inconstância de Juninho Capixaba, que chegou para suprir a saída de Guilherme Arana, Sidcley levou 48 horas para deixar de ser um atleta esquecido no banco do Atlético-PR e virar a solução para os problemas corintianos.

Aos 25 anos, o canhoto tem riso fácil e aparenta levar a vida sem muitas preocupações. “Se estou triste, não falo para ninguém. Tento curtir os momentos do mesmo jeito”, disse o atleta em meio a um papo de quase meia hora com a Gazeta Esportiva, no CT Joaquim Grava, quando se preparava para encarar seu 21º jogo com a camisa do clube que defende há pouco mais de dois meses, contra o Internacional, no Beira-Rio.

Adaptado ao Alvinegro, Sidcley demonstrou pouca preocupação com seu futuro. Emprestado apenas até o final do ano, ele relembrou as andanças que o levaram de Dubai a Campo Grande antes mesmo de estrear na elite nacional, disse que se acostumou a viver sozinho e ainda brincou com a situação de andarilho da bola. “Saí de casa pela primeira vez aos 13 anos, passei muito tempo longe da minha família. Quando levei eles para ficarem comigo, em Curitiba, quem saiu fui eu (risos)”, observou.

Ciente da rapidez com que as coisas acontecem no futebol, o camisa 16 disse que não se preocupa em alcançar os números de Arana, mas ficou feliz em saber que já tem três gols no Alvinegro, apenas um a menos que o antecessor. Sobre Juninho Capixaba, seu amigo e conterrâneo, assegurou que não se considera à frente dele no elenco. “Todos estão juntos, com o mesmo objetivo. Não sou dono da posição”, disse o agora viciado em defender, característica outrora tida como sua deficiência, mas a que ele mais ressaltou no papo que você confere abaixo.

“Estou parecendo modelo, que é isso”, brincou o lateral quando posava para as fotos (Foto: Sergio Barzaghi/Gazeta Press)

Gazeta Esportiva – Você esperava tomar conta da posição tão rapidamente?

Sidcley – Vim me preparando bastante no Atlético-PR e claro que todo jogador quer chegar jogando, ter oportunidade. Carille me deu essa oportunidade e eu pude agarrar da melhor maneira. Os companheiros também são todos tranquilos, gente boa, me deram muita força. Foi mais tranquilo para mim.

Gazeta Esportiva – Mas, na verdade, quem foi contratado para ser o dono da posição foi o Juninho Capixaba…

Sidcley – Eu fui contratado para disputar posição, ninguém é dono da camisa, todo mundo trabalha forte. Não tem essa de titular ou reserva, o importante é todo mundo se dedicar.

Gazeta Esportiva – Mas o início fica mais impressionante pela rapidez com que tudo aconteceu, não?

Sidcley – É, foi mesmo tudo muito rápido. Em dois dias eu estava treinando aqui e depois jogando. Ainda bem que deu certo.

Gazeta Esportiva – Por que você, hoje titular do Corinthians, tinha perdido espaço no Atlético-PR?

Sidcley – Foi a virada de ano, pré-temporada, estava tudo novo ainda, todo o mundo pegando ritmo de jogo. Só tinha treinado. Nem eu nem o que estava lá também, o Carleto, meu parceiro. Não tenho nada a dizer sobre ele também. Era isso. Estava começando, pode ver que o time estava mudando bastante, era outro jeito de jogar, por isso que tinha que rodar todo mundo para ver quem é que ia ser no momento do jogo.

Gazeta Esportiva – Lá você chegou até a ser adiantado para jogar como meia. Você tinha problemas com marcação?

Sidcley – Não, depende dos times, do momento. Muitos treinadores me colocaram lá na frente porque meu ataque é bom, por causa do um contra um, fui até artilheiro do Atlético no Brasileiro do ano passado. Foi importante para mim. Mas foi mais pela minha qualidade (que jogou mais adiantado).

Gazeta Esportiva – Aqui no Corinthians você já tem três gols. O Guilherme Arana, que foi o grande destaque da posição, marcou quatro com a camisa do clube (em três anos). Tem o objetivo de passá-lo?

Sidcley – Não, não tem esse negócio de números do Arana, eu fazer melhor que ele. Eu tenho que fazer o melhor para o grupo. No momento é marcar, conseguir marcar bem para que Jadson e o Rodriguinho façam os gols deles (risos).

Gazeta Esportiva – Você já falou bastante sobre marcação. Disse até que sua melho partida foi na final do Paulista, contra o Palmeiras, quando fechou bem a linha de quatro. É uma cobrança pessoal?

Sidcley – Com certeza. É o foco aqui do Corinthians, marcar bem e depois sair para o jogo. Para mim, estou fazendo um bom trabalho. Tenho meus erros, todo mundo tem, mas estou focado para corrigi-los. Na frente, no um contra um, é o meu forte. Sei que, aprendendo bastante com o treinador e o grupo, vamos conquistar os melhores objetivos.

Gazeta Esportiva – Quem te cobra mais nesse sentido dentro de campo?

Sidcley – Todos ali vão se ajudando. A gente treina bastante. No jogo, eu falo bastante com o Henrique, pela proximidade. Quem jogou nos últimos jogos pela esquerda foi o Romero, também falamos. Essa comunicação é boa aqui.

Gazeta Esportiva – Você citou a mudança de lado do Romero. Fica mais tranquilo com ele ajudando ali na defesa?

Sidcley – É característica dele. É diferente. O Clayson é mais de atacar, ir para cima, apesar de ajudar. Vital também, outro que vai mais para cima. Romero, não, é marcação, um, dois, cruza, faz os gols. Um ajudando o outro. Cada um tem sua característica e, na hora da partida, tem que se adaptar o mais rápido possível ao estilo de quem estiver jogando.

Sidcley guarda com carinho a lembrança da final do Paulista (Foto: Thiago Bernardes/Framepoto/ Gazeta Press)

Gazeta Esportiva – Você citou alguns erros seus, quais foram?

Sidcley – Não tem nada específico. Todo mundo erra e acerta. Tem jogo em que eu estava bem outros que eu estava mal. O bom é que o grupo sempre me apoiou.

Gazeta Esportiva – Você jogou 19 jogos seguidos quando chegou, saindo só em dois deles. Não sentiu o desgaste?

Sidcley – Não, fiquei muito tempo sem jogar, alguns meses, minha pré-temporada foi longa. Tem horas do jogo em que a característica do jogo não está boa para mim e o treinador muda. Ninguém vai 100% bem em todos os jogos. Quando precisar, o Juninho pode entrar, o Maycon pode entrar…

Gazeta Esportiva – Aliás, sobre o Juninho. Vocês dois são capixabas, já desenvolveram uma amizade aqui no Corinthians?

Sidcley – Nós conversamos bastante. Juninho é um parceiro meu, fizemos um jogo beneficente lá no Espírito Santo. Conheço ele de anos.

Gazeta Esportiva – Lá do Espírito Santo?

Sidcley – É. Meu parceiro de lá, gente boa demais, muito querido por todos. Fizemos um jogo lá no Tupi, em Vila Velha, uma escolinha que eu passei lá em Vila Velha. Nem sabíamos que íamos jogar juntos aqui (risos). Vir para cá, estar no mesmo ambiente, alegre, sendo campeão junto, levando os títulos para lá. Temos uma amizade bacana.

Gazeta Esportiva – Você sente que ele, mesmo não jogando, continua feliz aqui?

Sidcley – Sim. Lógico que todo jogador quer jogar, ele jogou um jogo agora, aproveitou a chance. O objetivo de todos é o mesmo.

Antes mesmo de jogarem juntos, Sidcley e Juninho já eram amigos (Foto: Reprodução)

Gazeta Esportiva – Vocês dois são bastante novos, você com 25, ele com 20. E você mora sozinho aqui. Como está sendo a adaptação a São Paulo?

Sidcley – Está sendo tranquila, já conhecia bastante gente aqui, morei um ano jogando no São Caetano. Minha família consegue estar perto também, Curitiba é só 40 minutos de avião. Eles vieram no Dia das Mães, que foi meu aniversário, da minha mãe também, veio minha filha…

Gazeta Esportiva – É dela que você sente mais falta, da Ana Clara?

Sidcley – Sim, né? Pai sente bastante. Ainda mais porque ela sempre foi muito grudada comigo. Todo dia presente. Aí do nada você sai, deixa sua filha longe… Mas é consequência do trabalho, todo mundo sabe como é. Comigo não é diferente. Quando dá eu vou lá e tento resolver essa saudade.

Gazeta Esportiva – E como foi esse período no São Caetano, conhecendo São Paulo?

Sidcley – Olha, eu joguei lá, depois fui para o Linhares, depois fui para Dubai, depois Catanduvense. Eu era muito novo quando morei por aqui, saí do Espírito Santo com 13 anos, fui para Campo Grande, foi bacana a peneira, o time gostou. Mas não me adaptei lá. Minha mãe ficava preocupada. Depois voltei, fui para o Grêmio, rodei bastante por aí.

Gazeta Esportiva – Então você já está acostumado, tira de letra isso de ficar mudando.

Sidcley – (Risos). Sim, sim, nunca fiquei muito tempo com a família desde a primeira vez que saí. No ano passado que eu levei minha família para ficar comigo em Curitiba, para ficar mais tempo com eles, aí apareceu esse negócio do Corinthians (risos). Mas é coisa boa, eles sabem como no Corinthians a gente aparece para o mundo, a visibilidade, o tamanho. A família e os amigos entendem, eu faço o que gosto. Estão falando bem de mim, torcida, imprensa e todo mundo. O time está focado, bem ajeitado, todos juntos. Isso que é importante.

Minha princesa 👨‍👧❤😍

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Gazeta Esportiva – Você realmente parece estar bem integrado ao elenco. Na volta da Venezuela, contra o Lara, jogou até baralho com os torcedores?

Sidcley – Eu brinco com todo mundo, sou um cara feliz. Se eu estiver triste, não falo para ninguém. Tento aproveitar o máximo tudo ali. No voo da Venezuela a gente ficou brincando bastante, zoando, tinha torcida. Tinha que ser assim, porque o barato é longe, hein? Até passou mais rápido.

Gazeta Esportiva – E ficou bastante tempo concentrado também, né.

Sidcley – É, passo mais tempo aqui do que na minha casa. Quando fica assim, zoando, você pega amizade, já entra no convívio, o grupo é muito bom, como eu te falei. Ninguém tem rixa com ninguém, comigo não foi diferente. Eles me abraçaram, fiquei feliz com isso.

Gazeta Esportiva – Pensando no futuro, você já tem 25 anos, uma idade considerada quase limite para uma transferência para a Europa. Planeja isso?

Sidcley – Então, isso é consequência do trabalho, quem faz o trabalho bem, consegue. Todo mundo quer jogar na Europa, qualquer jogador. Tenho vários amigos do Atlético-PR que foram para lá, mesmo o Otávio, que joga com o Malcom lá no Bordeaux. O “Tavinho” é um cara que eu fiz uma amizade verdadeira mesmo. Vai vir para cá, me visitar, amizade é isso. Qualquer lugar que você vai, a amizade continua. Agora tem Whatsapp, Facebook, Instagram… ficou bem mais fácil.

Gazeta Esportiva – Você é um cara bem tranquilo com a vida. Mas o seu contrato vai só até o fim do ano aqui, alguém já veio falar com você de comprar seus direitos?

Sidcley – Então, quando nós fomos campeões eles (diretoria) me perguntaram sobre isso também e eu falei que eu estava focado aqui no Corinthians. Eu nem me meto nisso aí, deixo os dois times se resolverem porque eu sou melhor fazendo a minha parte em campo.

Gazeta Esportiva – Mas falando hoje, você ficaria no Corinthians?

SIdcley – Que nem eu falei, estou bem focado, adaptado, mas quem tem que resolver é o Atlético-PR e o Corinthians. Eu faço a minha em campo e espero (risos).