Um homem de fé - Gazeta Esportiva
Bruno Ceccon
São Paulo, SP
09/04/2017 09:00:27
 

A temporada de 2017 não vem sendo como Moisés planejou. Atrapalhado por uma grave lesão no joelho esquerdo, o meio-campista viu o Palmeiras cair na semifinal do Campeonato Paulista e nas quartas da Copa do Brasil. Recuperado, participou do revés nas oitavas da Copa Libertadores. Disputou apenas seis jogos no ano e está 14 pontos atrás do Corinthians no Brasileiro. Ainda assim, mantém a fé.

Um dos destaques do Campeonato Brasileiro 2016, Moisés está vinculado ao clube alviverde até o final de 2020. Após duas temporadas às voltas com lesões e cirurgias, o meio campista de 29 anos tem a convicção intensa e persistente na possibilidade de abrir caminho para novos títulos com a camisa da Sociedade Esportiva Palmeiras. “A gente vai conquistar, eu não tenho dúvida”, profetizou à Gazeta Esportiva.

Escalado em quatro jogos desde que se recuperou, Moisés estima precisar de mais duas partidas para alcançar o nível ideal. O meio-campista, animado pela parceria com o venezuelano Alejandro Guerra, projeta uma evolução significativa do Palmeiras com as duas semanas de trabalho antes do confronto com o Atlético-MG, marcado para 9 de setembro.

Cotado para defender a Seleção Brasileira no começo do ano, o religioso Moisés ainda não abriu mão do ambicioso desejo de ganhar uma oportunidade do técnico Tite na Seleção Brasileira antes da Copa do Mundo da Rússia 2018. “Era um sonho e não morreu”, afirmou o meio-campista, ciente de que o grupo nacional já está praticamente definido.

Gazeta Esportiva – Já teve tempo de enquadrar a camisa 10 do Palmeiras?
Moisés – Ainda não. Vou enquadrar a que usei no jogo contra a Chapecoense, a terceira camisa, porque é muito bonita. E talvez a que usei na Copa Libertadores (contra o Barcelona de Guaiaquil), por ser uma partida tão importante. Estou de mudança agora de um apartamento para uma casa e lá vou ter um espaço reservado não só para as minhas camisas, mas também para as de alguns jogadores amigos, como Zé Roberto, Gabriel Jesus e Mina. Vou guardando alguns uniformes para, no futuro, relembrar um pouco da história, ver o que passou e com quem joguei.

Gazeta Esportiva – Parte importante da sua história foi o Campeonato Brasileiro de 2016. No começo deste ano, alguns palmeirenses viveram a expectativa de serem convocados para o amistoso entre Brasil e Colômbia, restrito a jogadores que atuavam no futebol nacional. O Dudu e o Vitor Hugo foram chamados, mas também havia expectativa por Jean, Tchê Tchê e você…
Moisés – Eu esperava muito, sim, essa convocação. Desde 2016, quando surgiu o amistoso só com jogadores do Brasil, abriu essa possibilidade. Mas passei por um procedimento cirúrgico (retirou pinos do pé esquerdo) nas férias e não voltei no meu estado físico normal. Como não pude treinar nas férias, estava um pouco acima do peso. Por algumas circunstâncias, acabei não sendo chamado. Mas são coisas que acontecem no futebol e a gente tem que continuar trabalhando, porque a chance pode aparecer quando você menos espera. Precisa estar preparado para ir e corresponder.

Gazeta Esportiva – O Campeonato Brasileiro está paralisado em função dos compromissos do Brasil pelas Eliminatórias. No ano que antecede a Copa do Mundo da Rússia, disputar uma vaga na Seleção era uma das suas prioridades?
Moisés – Era um sonho e não morreu. O sonho continua aqui, permanece. Mas também compreendo a realidade do momento: fiquei quase seis meses parado e a Copa já está muito próxima. O Tite vem fazendo um trabalho excelente e está bem perto de fechar o time. O que penso é em fazer o meu melhor no Palmeiras e retomar o ritmo do ano passado. Se conseguir fazer isso, minhas chances aumentam. Aí, a gente vê se vai ser possível realizar esse sonho ou não. Mas ele está aqui, bem vivo, e vou fazer o meu máximo para que um dia aconteça.

Gazeta Esportiva – O Tite vem armando a Seleção no esquema 4-1-4-1, com jogadores versáteis no meio de campo. Você se enxerga nessa maneira de jogar, talvez no papel do Renato Augusto?
Moisés – Sim, com certeza. Alguns jogadores até possuem características um pouco parecidas com as minhas. Eu acompanho todas as partidas com atenção e, caso um dia seja chamado, vou procurar dar o meu melhor. Todas essas funções de meio-campo, fiz no Palmeiras durante o ano passado. Inclusive, no jogo contra o São Paulo, cheguei a jogar de primeiro e segundo (volante) e também atuei como o primeiro da linha mais ofensiva. Tenho essa característica de conseguir rodar nas três posições. Sem dúvida, nas funções que saem de trás, o Paulinho e o Renato Augusto têm muita facilidade. Aprendo e evoluo assistindo a esses caras jogarem. Espero um dia, quem sabe, poder estar, se não jogando, junto com eles.

Gazeta Esportiva – Esse dia poderia estar mais próximo se você não tivesse sofrido uma grave lesão no joelho esquerdo, logo em fevereiro. Atualmente, com quatro jogos disputados desde seu retorno, já se sente plenamente recuperado?
Moisés – Em termos de dor e clinicamente, estou 100%, sem dúvida. Já fui até bem testado quanto a isso. No meu primeiro jogo, contra o Atlético-PR, o Sidcley deu uma entrada com 5 minutos do segundo tempo, um carrinho na perna por trás, um lance totalmente perigoso. Mesmo assim, não tive receio algum e continuei normalmente. Contra o Barcelona de Guaiaquil, inclusive, tomei uma pancada muito forte e, mesmo assim, consegui jogar. Não é que anteciparam minha volta. É que eu estava realmente bem.

Gazeta Esportiva – Por uma infeliz coincidência, o volante Zé Antônio, hoje no Figueirense, participou dos lances que ocasionaram suas duas lesões pelo Palmeiras (em 2016, sofreu fratura no pé esquerdo). Que sentimento ficou em relação a esse jogador?
Moisés – Fiquei triste na época e falei com ele a razão. Mas é lance de futebol. Em momento algum achei que ele foi com a intenção de me machucar. É um jogador forte, que entra firme e, coincidentemente, as duas lesões aconteceram com ele. É claro que, se puder evitar de enfrentá-lo no Paulista, vou evitar. Não só por… Fica aquela desconfiança dele também de chegar em mim. De repente, vai que ocorre um novo lance e vão falar que ele está de marcação comigo, mas não tem nada disso. Fiquei triste e falei com ele os meus pontos. Ele falou os dele. Mas é vida que segue e torço para que faça uma boa campanha no Figueirense. Que Deus abençoe a vida dele.

Gazeta Esportiva – Em quanto tempo você consegue recuperar o ritmo que considera ideal?
Moisés – Evoluí bastante. No último jogo, contra o São Paulo, me senti melhor. É claro que ainda não recuperei o ritmo do ano passado, mas já estou bem próximo disso em termos de movimentação, velocidade e explosão. Sou um jogador que não tem essas características tão afloradas, mas aos poucos vamos recuperando. A parada no Brasileiro vai ajudar nesse sentido. Com mais um ou dois jogos, já vou estar no nível adequado. Aí, é só entrosar mais com os companheiros no estilo que o Cuca está colocando para que possamos evoluir juntos e fazer um grande restante de Brasileiro.

Gazeta Esportiva – Nos últimos jogos, você atuou ao lado do Guerra no meio de campo. Contra o São Paulo, tiveram a companhia de Bruno Henrique e Tchê Tchê no setor. Falando em entrosamento, como vem sendo atuar com o Guerra? É um estilo de meia que você gosta?
Moisés – Gosto muito de jogar com ele. É um cara extremamente habilidoso. Quem não gosta de jogar com alguém técnico, habilidoso e que gosta de ter a bola nos pés? Fico muito confortável jogando com o Guerra. Na semana da partida contra a Chapecoense, fizemos grandes treinos juntos, mas no jogo acabou não acontecendo. Na semana seguinte, fizemos novamente bons treinos e fluiu ainda com o Tchê Tchê, outro cara que gosta de ter a bola nos pés. Então, ficou um meio-campo bem gostoso de jogar e a tendência é evoluir ainda mais, porque são atletas de qualidade, que têm uma forma de jogar parecida. Acaba ajudando bastante.

Contra o Barcelona de Guaiaquil, Cuca usou Moisés e Guerra pela primeira vez (Foto: Fernando Dantas/Gazeta Press)

Gazeta Esportiva – O Tchê Tchê vem oscilando durante a temporada e, jogando ao seu lado, está melhorando. De uma certa forma, você acha que contribui para ele crescer de produção?
Moisés – Acho o Tchê Tchê um jogador fantástico. No ano passado, foi um cara que carregou bastante nosso time. Tem a facilidade de conduzir a bola com os dois pés e joga fácil. Então, fico feliz por retornar e ele estar subindo de nível, porque pode nos ajudar bastante. Acredito muito nele. Viveu um momento de instabilidade, o que é normal. Até ano passado, pouco se falava em Tchê Tchê. Ninguém conhecia. Fez uma temporada maravilhosa e acabou oscilando neste ano. Os adversários começam a se preocupar e, pela forma dele de jogar, os treinadores mandam marcar um pouco mais. Mas, com o time melhorando, ele pode evoluir junto e vamos fazer um grande restante de Brasileiro.

Gazeta Esportiva – A eliminação nas oitavas de final da Copa Libertadores continua muito viva entre os torcedores. Você foi um dos jogadores que, ainda no gramado, procuraram proteger o Egídio após a falha no pênalti contra o Barcelona de Guaiaquil. Desde então, ele foi preservado pelo Cuca. Como sente o Egídio no dia a dia?
Moisés – Eu protegi, porque é um ser humano e ninguém entra em campo com a intenção de errar. Quem mais queria marcar aquele pênalti era o Egídio, não tenha dúvida. É um profissional, um cara que trabalha sério e, infelizmente, vivia uma fase que o torcedor não vinha gostando. Mas ele já está bem melhor, mais tranquilo e retomando o ritmo ideal. A tristeza é normal em uma eliminação e o nome acabou sendo muito falado. Foi preservado e, no momento certo, o Cuca, inteligentemente, vai voltar a usá-lo, porque é um cara sensacional e com uma qualidade incrível.

Gazeta Esportiva – A Copa Libertadores, para o Moisés, também é uma obsessão?
Moisés – Para mim, é. Mas só quando eu estiver disputando. Agora, ela passa a ficar em segundo plano. Temos que focar apenas no Brasileiro e conseguir uma vaga novamente, porque só ganha a Libertadores quem disputa. Então, estamos concentrados para participar em 2018. Esperamos aprender com o que erramos e fazer um campeonato ainda melhor.

Gazeta Esportiva – Há quem diga que ainda é possível brigar pelo título brasileiro…
Moisés – Se parar para pensar, ainda dá. Na matemática, são muitos pontos e isso te permite sonhar, apesar de você depender dos outros. Mas nosso principal objetivo deve ser brigar contra nós mesmos e evoluir em termos de jogo para fazer o máximo possível de pontos. De acordo com isso, vamos ver o que nos reserva o final do campeonato.

Conhecido como Profeta, Moisés é um homem de fé (Foto: Fernando Dantas/Gazeta Press)

Gazeta Esportiva – Até o jogo contra o Atlético-MG, marcado para 9 de setembro, o Palmeiras terá quase duas semanas para treinar. O Cuca costuma aproveitar bem esses períodos com tempo para trabalhar…
Moisés – Sem dúvida, o Cuca já provou isso. Fez grandes trabalhos quando teve tempo para treinar e colocar seu estilo de jogo. Contra o São Paulo, já demos uma amostra disso, de trabalho tático e técnico. É claro que tivemos alguns erros e a vitória não esconde isso. Mas a gente já deu uma amostra muito grande e a tendência é evoluir ainda mais com essas duas semanas de trabalho.

Gazeta Esportiva – Como estava lesionado, você viu boa parte da temporada com certo distanciamento. Consegue apontar o que faltou para pelo menos participar da briga direta por títulos?
Moisés – É porque futebol não é uma ciência exata. Se fosse… Todos falaram que o Palmeiras conquistaria títulos neste ano e esse era o objetivo. O plantel foi feito e a estrutura permitia, mas não aconteceu. Por outro lado, não tenho dúvida de que, com esse grupo e tudo que se criou, vamos conquistar. Se não for neste ano, vai ser no próximo, porque o Palmeiras vem fazendo um trabalho de curto, médio e longo prazo. Esse planejamento não vai ser perdido só porque neste ano não conquistamos. O planejamento foi feito para algumas temporadas e a gente vai conquistar, eu não tenho dúvida.

Gazeta Esportiva – Desde que chegou ao Palmeiras, atrapalhado por duas lesões, você disputou apenas 45 partidas, 34 no vitorioso Campeonato Brasileiro 2016. Depois desse período turbulento, o que imagina até o final do seu contrato, em 2020?
Moisés – Agora, sempre que entro em campo, o que mais peço é para não sofrer novas lesões. Não sou um jogador de ter lesão. Fui ter agora, com 28 anos. Foram dois problemas por pancadas, circunstanciais. Espero que não aconteça novamente. Sem lesões, você pode treinar mais, em busca de uma melhor condição, o que aumenta também o nível técnico.

Gazeta Esportiva – No elenco atual, você é um dos jogadores mais queridos pela torcida. Com um contrato longo e um título já conquistado, sente que está no caminho para ganhar o status de ídolo?
Moisés – Sinto que sou muito querido, um cara que o torcedor admira. Mas, para me tornar ídolo, acredito que ainda falta bastante. Quando atingir uns 200 jogos e conseguir mais um ou dois títulos importantes, talvez entre para esse hall.