Seleção enfraquecida - Gazeta Esportiva
Gabriel Ambrós*
São Paulo
03/10/2019 08:30:46
 

A Seleção Brasileira sub-20 encerrou sua participação no Sul-Americano da categoria, no último dia 10 de fevereiro, com vitória sobre a Argentina por 1 a 0, mas o resultado não foi suficiente para evitar o vexatório quinto lugar no hexagonal final do torneio. Com isso, a equipe comandada por Carlos Amadeu não se classificou para o Mundial que será disputado neste ano na Polônia. É a segunda vez consecutiva que o time brasileiro não garante vaga para o principal torneio da categoria. Levando em conta os últimos quatro Sul-Americanos, o Brasil só se qualificou em um.

O desempenho decepcionante nos torneios internacionais torna ainda mais urgente a discussão sobre o trabalho das categorias de base do país. De alguma forma, estariam os processos mencionados na primeira e segunda parte do especial sobre a saída repentina das jovens revelações, ecoando no trabalho da Seleção? Como essas dinâmicas atrapalham o nosso futebol?

“O problema é planejamento” 

Em entrevista à Gazeta Esportiva, o ex-treinador da Seleção sub-20 e olímpica, Rogério Micale, deu sua versão sobre os fracassos da equipe brasileira e a relação entre desempenho, formação de atletas e o êxodo cada vez mais precoce.

“O problema é planejamento, de quem está no comando. Eles não planejam nada, é tudo na base do improviso. Quando eu fui vice-campeão mundial em 2015, a gente teve duas, três semanas de treinamento para se preparar. Isso não é planejamento. Conseguimos ser vice-campeões, mas nem sempre isso acontece”, declarou o técnico.

Afiado nos comentários, Micale não se desviou dos questionamentos sobre o desempenho da Seleção e contou como os bastidores do Sul-Americano funcionam. “A Seleção Brasileira é um reflexo da falta de planejamento. A culpa agora vai cair toda no [Carlos] Amadeu, assim como já caiu nas minhas costas em 2017”, apontou o treinador.

“Muitas vezes o jovem atleta já está com a cabeça na Europa. As maiores vendas são feitas lá no Sul-Americano. Mesmo quando o jogador está lá ele não está com a cabeça no torneio, acaba usando a Seleção para ter sucesso na vida pessoal, e isso é resultado de uma falta de planejamento”, contou.

Micale foi vice-campeão mundial com a equipe sub-20 do Brasil em 2015 (Foto: Lucas Figueiredo/Mowa Press)

O comandante, que teve passagens por Atlético-MG e Paraná em 2018, criticou o trabalho feito pela CBF que, ao seu ver, não dá a devida atenção às categorias de base. “Não se treina. São poucos encontros com os jogadores para trabalhar. Em contrapartida, Venezuela, Equador e Colômbia estão treinando direto. Aqui no Brasil a gente não se atenta a essas coisas, achamos sempre que vamos ganhar na camisa”, apontou.

“A Seleção Brasileira ficou sem um coordenador técnico por mais de um ano e meio, anunciaram o Branco há quatro meses, e a base ficou à deriva, como normalmente fica”, exemplificou Micale. “Aí chega nesta época do ano, os resultados não vêm, e a culpa acaba ficando para quem está na ponta da corda, o treinador na beira do campo”, concluiu.

“Agora o Amadeu vai ser mandado embora, vamos repetir os mesmos erros e daqui dois anos vamos estar conversando a mesma coisa”
Micale

Em comparação, Micale citou que “o Dudamel é técnico sub-20 da Venezuela desde 2015, o treinador do Uruguai [Fabián Coito] está a três gerações [desde 2014], o treinador da Colômbia [Carlos Restrepo], que também não se classificou para o Mundial de 2017, permanece lá. Mas o Brasil não, só se olha o momento”.

Procurada pela reportagem, a CBF preferiu não comentar sobre as declarações proferidas por Micale. O único apontamento foi que não houve vácuo na coordenação técnica da base; segundo informou a confederação, antes da chegada de Branco, o trabalho estava sendo realizado por Edu Gaspar.

Sem novidade

Responsável pelo comando da equipe que fracassou na busca por uma vaga no Mundial sub-20, Carlos Amadeu teve sua demissão anunciada pela CBF no último dia 21 de fevereiro. Após quatro anos na Confederação e títulos comandando a equipe sub-17, o técnico assumiu o sub-20 depois da saída de Micale, mas não teve sucesso.

Carlos Amadeu não resistiu a campanha decepcionante do Brasil no Sul-Americano sub-20 (Foto: Mauro Neto/Sejel Amazonas)

Amadeu foi o quinto treinador a comandar a equipe sub-20 do Brasil nesta década. Além dele e de Micale, Alexandre Gallo, que dirigiu o time no Sul-Americano de 2015, Emerson Ávila, que dirigiu o time no Sul-Americano de 2013 e Ney Franco, que dirigiu o time no Sul-Americano de 2011, acumularam passagens na CBF.

Campanha do Brasil no Sul-Americano sub-20

Apesar de não apresentar um bom futebol, a Seleção Brasileira avançou da primeira fase da competição, com a segunda colocação do grupo A, após duas vitórias, um empate e uma derrota. A equipe comandada por Amadeu estreou com um empate sem gols contra a Colômbia, e posteriormente bateu a Venezuela por 2 a 1, perdeu para o Chile por 1 a 0 e finalizou a etapa com vitória sobre a Bolívia por 1 a 0. Ao todo, os brasileiros só balançaram as redes três vezes em quatro jogos.

Na segunda fase, com a maior exigência técnica, também vieram piores resultados. O time empatou sem gols com a Colômbia mais uma vez e perdeu para a Venezuela por 2 a 0. Já pressionada, a equipe teve uma melhora de desempenho contra o Uruguai, mas cedeu um gol no fim e acabou derrotada por 3 a 2.

Depois do segundo revés consecutivo, mais um empate sem gols da equipe brasileira, desta vez contra o campeão Equador. Na última rodada, o Brasil precisava vencer por três gols de diferença para alcançar a quarta posição e garantir vaga no Mundial. Do outro lado, a Argentina precisava de um empate para se sagrar campeã. No fim, a Seleção venceu por 1 a 0 e nenhum dos times atingiram os seus objetivos.

*especial para a Gazeta Esportiva



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