O homem que fez a Croácia sonhar grande - Gazeta Esportiva
Marcelo Baseggio
Zagreb, Croácia
09/19/2018 10:25:42
 

“Eu odeio empate em 0 a 0. Sei que existe e pode ser bonito, mas não gosto”. A frase diz muito sobre quem a proferiu. Hoje com 50 anos, Davor Suker não é nem de longe aquele atacante letal que ganhou fama por todo o mundo após terminar a Copa do Mundo de 1998 como artilheiro, com seis gols, superando Ronaldo. Ainda assim, ele segue como uma figura extremamente importante no futebol croata e teve grande participação no sucesso da seleção de seu país no Mundial da Rússia.

Atualmente, Suker é presidente da Federação Croata de Futebol, cargo que ocupa desde 2012 – foi reeleito no ano passado. Sob sua gestão, a seleção do país conquistou em julho o melhor resultado em Copas de sua história ao ficar com o vice-campeonato, perdendo para a França na final. Duas décadas antes, os croatas, recentemente livres da Iugoslávia, ficaram em terceiro, quando também caíram para os franceses, nas semifinais, antes de baterem os holandeses pela medalha de bronze.

“A Copa do Mundo sempre é o sonho de toda criança, de cada jogador que acaba podendo representar seu país. É motivo de muito orgulho participar de uma Copa do Mundo. Foi a primeira que a Croácia participou, um país de 4,5 milhões de habitantes, depois da guerra…. então, era um bom trampolim para promover a Croácia pelo mundo. Há uma estatística que mostra que antes da Copa do Mundo, 4 ou 5% das pessoas conheciam a Croácia. Depois da Copa do Mundo, mais de 40% afirmaram conhecer a Croácia. Futebol é algo importantíssimo, e a Copa do Mundo é um sonho cumprido para qualquer jogador. Para mim, foi um orgulho jogar em 1998 na França”, afirmou Suker.

E que ano mágico para Davor Suker. Além de ser a estrela do time que até então havia feito história nas Copas do Mundo, o atacante também não se contentou “somente” com a chuteira de ouro dada ao artilheiro do Mundial. Ao lado de Ronaldo e Zinedine Zidane, o croata viajou a Barcelona para a premiação do melhor jogador do mundo, esta vencida pelo camisa 10 francês, seguido pelo brasileiro.

“Tenho esta foto da premiação em Barcelona. São dois grandes amigos meus, desejo tudo que há de melhor para eles. Vi que o Ronaldo comprou o Real Valladolid, time da Primeira Divisão da Espanha. Me alegro por isso, lhe desejo toda a sorte do mundo. Ao Zidane, que ganhou tudo com o Real Madrid, também. Gosto muito de assistir às partidas da Liga dos Campeões para encontrar com eles, beber algo e recordar os velhos tempos”, comentou.

Agora como dirigente, seus focos são outros. Se dividindo entre as demandas da Federação Croata de Futebol, da Uefa, onde é membro do Comitê Executivo e vice-presidente de Marketing, e da Fifa, onde é membro do Comitê Organizador para torneios da entidade. Justamente por isso, ele não esconde suas preocupações sobre o caminho que o esporte está tomando.

Todos querem ganhar mais dinheiro, cada ano temos mais jogos. Aonde chegamos com 80 ou 100 jogos? Temos que ser prudentes, conversar sobre isso, porque uma hora mataremos o futebol.

Entretanto, Suker tem muito mais a contar do que apenas suas honrarias e glórias. Atual homem forte do futebol croata, ele contou à Gazeta Esportiva sobre como chegou à presidência da federação de seu país, os planos que possui para manter a seleção da Croácia no topo, falou sobre Romário e Ronaldo, para quem perdeu duas vezes a artilharia do Campeonato Espanhol, campeonato que disputou vestindo as camisas do Sevilla e Real Madrid, Diego Armando Maradona, com quem teve o privilégio de atuar, o motivo pelo qual a Seleção Brasileira não confirmou seu favoritismo na Copa do Mundo e muito mais.

Gol, um momento sagrado 

Para mim o gol é algo sagrado, algo que você faz na rua, na escola, algo que você faz porque treina, o ponto alto do futebol é o gol, marcar mais gols que o adversário e conseguir a vitória. Então, ser o artilheiro da Copa do Mundo foi um orgulho para mim, e o sonho foi cumprido. Quando você para pra pensar que havia Ronaldo, Batistuta, muitos jogadores concorrendo comigo naquela Copa, não é algo fácil, porque marquei seis gols.

A saborosa vitória sobre a Alemanha nas quartas de final do Mundial de 1998

Os alemães nos subestimaram, falaram mal da nossa equipe, que os croatas eram um pouco lentos, que eles eram maiores. Bom, no campo são 11 contra 11, e é ali onde você tem que demonstrar sua força. Creio que demonstramos ganhando por 3 a 0, com força de vontade jogamos uma das melhores partidas da história do futebol croata.

O caminho até a presidência do futebol croata

Mais ex-jogadores gerindo o futebol 

A única coisa que quero é que muitos ex-jogadores entrem no futebol, porque o futebol necessita da gente, que sabe de verdade. Agora, não vou me meter nas leis, porque essa não é minha vida, mas posso ajudar juntando pessoas que podem trabalhar para as Federações, dar êxitos. Desejo que a cada ano haja mais ex-jogadores no futebol. Vi o Roberto Carlos em Moscou, estamos sempre nos falando, recordando os velhos tempos. Sou muito rico em amizades, tenho muitos amigos por todos os lugares em que joguei.

O privilégio de ser companheiro de Maradona

Primeiramente, ninguém acreditava que o Maradona iria chegar ao Sevilla. É um dos melhores jogadores do mundo, me lembro dos primeiros dias, ele me disse: ‘Davor, você corre e não me olha, vou colocar a bola para você, você só precisa empurrar para o gol’. Creio que sou o único jogador croata que jogou com ele, que era seu companheiro. Nos vimos na Copa do Mundo, a Croácia ganhou da Argentina, mas nossa amizade vai durar para toda a vida.

Concorrência de Romário e Ronaldo pela artilharia do Campeonato Espanhol 

São dois monstros no futebol mundial, como marcam os gols, como jogam. O que mais me agrada é que eles jogavam no Barcelona, no PSV ou no Real Madrid como jogavam nas ruas, que é onde se aprende o controle da bola, os dribles. Não há que mudar, isso me agrada no futebol brasileiro e no futebol croata. Temos classe, dribles e qualidade. Às vezes, complicamos um pouco, mas isso é bonito para o futebol.

Planos para manter a Croácia no topo

O motivo para o fracasso do Brasil na Rússia

Alemanha, Brasil e Espanha não tiveram tanta fome. Nos últimos cinco, dez minutos, a bola não queria entrar contra a Bélgica, foi incrível. Como um jogador de tanta qualidade não consegue marcar o gol? Algo aconteceu na pré-temporada, com menos jogos, com treinamentos. Se um jogador não está fisicamente bem, mesmo sendo o melhor do mundo, é pior para vê-lo, porque não rende bem, é pior para o ambiente, para tudo. A Argentina fisicamente também não estava em seu melhor nível.

A seleção croata de 1998 era melhor que a de 2018?

Houve qualidade naquela época e há hoje em dia. Se pudéssemos mesclar os jogadores, seria um timaço. Mas, agora, até a transmissão dos jogos são diferentes. Antes, havia cinco câmeras. Hoje, 35. O campo é incrível, a bola é mais fácil. Se você tirasse a bola da grande área, não chegava do outro lado. Hoje, chega. Os goleiros foram menos favorecidos, porque as novas tecnologias existentes favorecem mais os atacantes que os goleiros, mas futebol se resume em gols, as pessoas desfrutam quando há mais gols. Eu odeio empate em 0 a 0. Sei que existe e pode ser bonito, mas não gosto. Futebol evoluiu muito, os campos com 1,3 cm estão maravilhosos, as chuteiras são de maior qualidade.

Otimismo para o futuro 

Em 1998 ficamos em terceiro, em 2018 em segundo lugar, e em 2038 venceremos. Espero que isso seja um pouco mais cedo, porque os croatas não podem esperar. Mas tomara que algo aconteça, que alguém nos leve ao título, que haja um presidente melhor que Davor Suker.



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