“Poucos iam pegar na bola” - Gazeta Esportiva
Tiago Salazar
São Paulo - SP
04/30/2019 12:00:01
 

Walter Casagrande Júnior chegou à casa dos 56 anos recentemente. Seu auge na carreira de jogador de futebol foi acompanhado por Sócrates, Zico entre outros craques imortalizados pelo esporte. Uma geração que não perdeu o encanto e admiradores nem mesmo diante de dois reveses em Copas do Mundo.

O hoje comentarista da Rede Globo chegou a figurar no grupo que foi ao México em 1986. Os titulares, na ocasião, eram Careca e Müller. Três opções de luxo a Telê Santana se um paralelo com a equipe de Tite for traçado.

O que ninguém discute, independente da qualidade, é que o futebol mudou drasticamente. Deixou de ser cadenciado para ficar acelerado. Os pontas foram extintos e a força física ganhou importância.

Ou seja, mais rápidos e mais fortes, os jogadores da atualidade sobrariam em esquadrões da década de 80, certo? Errado! No quarto episódio da entrevista exclusiva à Gazeta Esportiva, Casão é enfático ao ser levado a tal suposição.

Casagrandre fez parte do grupo da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1986 (Foto: Sergio Barzaghi/Gazeta Press)

“O pessoal de hoje, jogando nos 70, 80, poucos iam pegar na bola, porque era muito técnico o jogo. Os times eram técnicos, eram muitos jogadores técnicos. Você pegava Corinthians, São Paulo, Grêmio, Internacional, Atlético-MG, Flamengo, Cruzeiro… a base da Seleção era Flamengo e Atlético-MG. E todos os times do Nordeste eram times bons”, opinou o ex-jogador, que além do Timão e da Seleção também passou por São Paulo, Flamengo e Torino.

“Se você pega um time grande hoje: São Paulo, Corinthians, Santos e Palmeiras, vamos dizer, e pegar esses times e jogar lá em 82 para disputar o Campeonato Paulista. Cara, não ia pegar quarto (lugar)”, cravou.

Felipe Melo, talvez mais lembrado por suas atitudes fora de campo ou pelo estilo violento dentro dele, foi o exemplo escolhido por Casagrande para sustentar sua tese. Se para alguns o volante palmeirense é visto como líder, referência e até elogiado por algumas atuações, para Casão tudo seria bem diferente no ambiente que se tinha há cerca de três décadas.

“Felipe Melo ia ser expulso com cinco minutos de jogo em todos os jogos. Não era assim que se jogava nos anos 80. As faltas eram mais leves, porque o jogador não era tão violento. Acho muito difícil eles (jogadores de hoje) jogarem nos anos 80”, explicou, partindo para uma análise mais abrangente.

“Muito físico, muita velocidade. Aumentou a velocidade o jogador raciocina menos. É por isso que está tendo muita cabeçada, choque de cabeça dos jogadores. É por causa disso. Os jogadores ficaram mais rápidos que as jogadas”, afirmou.

“É muito diferente esse confronto físico de como era nos anos 80. Hoje é batida de carreta. O cara está no máximo da força física e o outro também”.

Casagrandre conheceu a redação da Gazeta Esportiva antes de ser sabatinado (Foto: Sergio Barzaghi/Gazeta Press)

A metamorfose do jogo não poderia deixar de mexer na posição que consagrou Casagrande. Na Rússia, a camisa 9 do Brasil foi ostentada por Gabriel Jesus, que passou em branco. De fato, não está fácil encontrar centroavante, principalmente do patamar que Casão chegou a alcançar.

“Hoje os centroavantes são diferentes. É muito importante para o centroavante hoje ter velocidade. Na década de 80 você não precisava ter velocidade. Você precisava ser inteligente, porque sempre tinha um gênio jogando com você, sempre, em qualquer time. Todo time tinha um cara acima da média e você tinha que ser inteligente para jogar com ele”.

Obviamente, Casagrande sabe que mesmo em uma década coroada por grandes jogadores nem tudo era perfeito. A questão apontada pelo eloquente entrevistado, porém, foca nas camisas mais pesadas do país.

“Quando a gente ia jogar no interior, era o futebol de hoje. Era a única arma que eles tinham de enfrentar um time que era muito técnico. Deixavam a grama alta ou um campo duro pra cacete, era só dividida, o Sócrates ia pegar na bola e já chegavam dando carrinho, o zagueiro que ia me marcar puxava meu cabelo, aquela coisa toda…”.



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