Conciliador, Garcia descarta dinastia própria e quer legado para o clube - Gazeta Esportiva
Tomás Rosolino e Helder Júnior
São Paulo (SP)
01/31/2018 10:15:42
 

Figura influente no Corinthians desde a década de 1980, com posições importantes até na gestão de Roberto de Andrade, o conselheiro Paulo Garcia fará mais uma tentativa de se tornar presidente do clube – após obter uma liminar contra a impugnação da sua candidatura. Derrotado por Andrés Sanchez em 2007 e 2009 e por Mário Gobbi em 2012, o dono da Kalunga, rede de papelaria e materiais para escritório responsável por um dos primeiros grandes patrocínios corintianos, acredita em um governo de conciliação com integrantes de outras chapas em caso de vitória, sejam situacionistas ou oposicionistas.

Para esmiuçar os projetos dos cinco candidatos à presidência do Corinthians, a Gazeta Esportiva colheu longos depoimentos de Andrés Sanchez, Antonio Roque Citadini, Felipe Ezabella, Paulo Garcia e Romeu Tuma Júnior. Cada um deles teve aproximadamente uma hora para defender as suas ideias e palpitar sobre os mais variados assuntos, da política corintiana à gestão da dívida do Estádio de Itaquera.

Na semana que termina com a eleição no Parque São Jorge, marcada para o sábado de 3 de fevereiro, as explanações dos postulantes ao cargo de Roberto de Andrade foram publicadas diariamente pelo portal, uma a uma, seguindo a ordem da realização das entrevistas. Abaixo, leia o que falou Paulo Garcia.

Por que ser candidato
Porque tenho condição estatutária e capacidade para isso. E sou corintiano desde que nasci. Decidi faz tempo, já. Decidi porque acho que posso contribuir bastante com o clube.

Desde a queda de Alberto Dualib, o dono da Kalunga concorreu três vezes à presidência (foto: Sergio Barzaghi/Gazeta Press)

O que mudar em relação à atual gestão
Não com relação à do Roberto (de Andrade) em si, mas às dos clubes como um todo. Hoje, você precisa ter um plano diretor para conhecer os objetivos que quer e pode cumprir por 10, 12 anos. Você divide o clube em quatro – estádio, clube social, base e profissional – e monta um planejamento de 10 anos para cada área. Por exemplo, no clube social, pega um arquiteto bom, vê o que precisa fazer e leva ao Conselho.

É claro que estou falando essa parte hipoteticamente, mas a ideia é que quatro ou cinco presidentes sigam esse plano. Se quiserem mudá-lo, terão que mudá-lo no Conselho. Isso te obriga a seguir um projeto, sabendo aonde quer chegar nos próximos 15 anos, o que pode gastar e o que vai ganhar. Não é o que acontece hoje, com o Corinthians gastando sem saber o que vai ganhar. Não se sabe como será feito depois, vive-se o dia a dia.

Aqui, na empresa (Kalunga), por exemplo, eu e o Beto (um dos irmãos de Paulo) já sabemos o que queremos para daqui a 10 anos, quantas lojas a gente quer abrir, com um plano de viabilidade econômica. Não adianta nada se você não souber isso. Não quer dizer que não possa mudar, mas é uma base.

Pegando uma empresa boa, faríamos o básico em três, quatro meses. Agora, para debater… É preciso passar pelo sócio, que, muitas vezes, nem sabe o que existe em alguns lugares do clube. Há um monte de empresas especializadas nisso, de desenvolvimento de shoppings, de áreas turísticas. Vamos fazer o plano, debater e ver o custo, o tempo para colocar em prática. Dependendo do Conselho, já daria para aplicá-lo na nossa gestão. Aqui, na Kalunga, eu faria já (risos), mas é mais difícil no Corinthians. Temos que propor um referendo e ver se se aprovam.

Estádio de Itaquera: bom ou mau negócio?
Construir o estádio foi um bom negócio. Só não sei se foi bom o negócio para construir o estádio (risos). São coisas diferentes.

É meio difícil julgar os outros. Em um ponto de vista, achei a gestão arrojada ao fazer CT, estádio. Só que, agora, existe todo um problema a ser equacionado.

Aparentemente, o estádio foi algo bom. O Corinthians teve sucesso lá dentro em termos de futebol. Só faltou um pouco de planejamento, porque as contas não fecharam. Fizeram mais no emocional, para a Copa do Mundo, e acabaram pecando nisso.

Sem acesso a contratos, Paulo Garcia não gosta de palpitar sobre o imbróglio financeiro de Itaquera (foto: Sergio Barzaghi/Gazeta Press)

Como resolver o problema da dívida de Itaquera
Não quero falar sobre isso. Não conheço os contratos. Escuto um monte de gente dizer que chega e paga o estádio. Uma pessoa que diz isso não tem noção empresarial. Também não existe falar que não vamos pagar.

Há uma carência de 90 dias, e precisamos estudar os contratos, fazer uma auditoria. Depois disso tudo, vemos como proceder. Hoje, não sei nada. Por exemplo: não sei se os CIDs (Certificados de Incentivo ao Desenvolvimento) são do fundo. Entendo que o Corinthians não tem 100% dos CIDs. É 1/3 para cada um. Como poderia ser 100% do clube se o fundo é dividido? Também não sei o que está na conta do clube, se a construtora está junto… Por isso, não poso falar. Quando tiver conhecimento, pego um advogado, uma pessoa especializada, e tomo uma atitude. Ir à Justiça é só em último caso. Devemos tentar um acordo, ver o que fica melhor para os dois (Corinthians e Odebrecht). Se não der certo, aí, sim, buscamos a arbitragem.

O Emerson (Piovesan, diretor financeiro da administração Roberto de Andrade, um dos seus candidatos à vice-presidência) também não está por dentro de contrato nenhum. Ele foi fazer uma negociação com a Caixa e a Odebrecht, e eles queriam o nosso programa de sócio-torcedor. Ele respondeu que precisaria levar isso para o Conselho. Nós votamos e não aprovamos.

É complicado discutir sem saber o contrato. Deve haver vários aditivos, adendos. Na grande realidade, você não sabe o que foi feito, se existem juros de mercado. É complexo. Em relação ao valor da obra, todo o mundo está declarando superfaturamento. Não quero dizer que isso aconteceu porque não sei. Não conheço o custo de uma obra dessa. Temos que fazer um plano com os pés no chão, senão não chegamos a lugar algum.

Direitos de nome do estádio
Precisamos buscar uma empresa especializada nisso. Acho que pode ser viável vendê-los, sim.

Parceria com a Omni, gestora do programa Fiel Torcedor
Não conheço o contrato. É difícil falar de fora.

Busca por um patrocinador máster
É uma prioridade. Uma empresa grande do Sul me ofereceu, se eu ganhar, R$ 48 milhões por três anos, R$ 16 milhões por ano. Falei que não quero, que é muito pouco. Aí, você vai lá, fecha um contrato desse tamanho e, daqui seis meses, já se foram os recursos. Você faz o quê? Renova esse contrato por mais tempo? Não dá para ser assim. Não sei quanto seria um valor justo, mas devemos arrecadar bem em cima disso. Temos que ver o que o mercado está oferecendo, pegar o pessoal do marketing e chegar a um valor.

Paulo Garcia quer gerir o Corinthians como a Kalunga, antiga patrocinadora máster do clube (foto: Sergio Barzaghi/Gazeta Press)

Publicidade para pequenas empresas
O que acaba acontecendo é que empresas de grande porte têm uma adequação de marca, de publicidade. Uma Hp (Hewlett-Packard, empresa de informática), por exemplo, só anuncia em veículo de primeira linha, e os seus executivos só andam de primeira classe, só se hospedam em hotéis cinco estrelas. Existe até um código de vestimenta. Quando você tem uma marca de menor valor ao seu lado, eles não entram. Não querem se aliar. Isso é difícil. Hoje, o Corinthians tem contratos com marcas menos expressivas, sim. Mas, bem ou mal, tem.

Outro problema que faz as grandes marcas fugirem do clube são essas coisas de Lava Jato. Banco, esquece. Ninguém quer ter a sua imagem atrelada. E o pior é que isso sai de dentro do próprio clube. É algo errado. Os adversários estão fora do Parque São Jorge, não dentro. O Andrés ganhou, o Dualib ganhou, tudo bem, não fiz nada contra eles. Mas, politicamente, o pessoal fica nessa história de que, quanto pior, melhor. Há cara que é do contra. Para brilhar a estrela dele, tenta apagar a dos outros. Não agrega nada.

Como, sem dinheiro, investir no departamento de futebol
Não sei detalhadamente qual é o tipo de dívida do clube, onde estão os impostos, o que é dívida de curto prazo, e o que temos a receber, por exemplo, da Nike e da Globo. Preciso estar com tudo na mão.

O Corinthians é futebol. Para o clube estar bem, o futebol precisa estar bem. Então, você precisa sempre se esforçar, fazer um sacrifício. O que não pode é fazer loucuras. Às vezes, temos que dar um passo para trás para dar dez para a frente. Se não for assim, ficamos na mesmice do endividamento dos clubes.

Temos potencial tanto para formar jogadores quanto para trazer renomados. O elenco precisa ser reforçado e passar por dispensas de muita gente.

Planos para as categorias de base
Você precisa ter pessoas competentes ao seu lado, planejamento. Sem isso, não chega a lugar algum. Um clube e uma multinacional precisam disso.

Por que as pessoas compram ações que estão em baixa de uma empresa? Porque elas conhecem o planejamento. Se um executivo não realiza, ele está fora. É preciso mostrar os números.

Então, não adianta eu ser eleito amanhã e colocar o meu amigo à frente da base porque ele toma uma cerveja comigo. Deve ser algo profissionalizado, com pessoas competentes em cada área. Todos enfrentam esse amadorismo no Brasil. Não dá para ser assim.

Candidato sabe que o novo presidente será mais cobrado em função dos títulos recentes (foto: Sergio Barzaghi/Gazeta Press)

O desafio de assumir um clube que tem sido vencedor em campo
É evidente que coloca mais pressão. A torcida ficou mal-acostumada. Por mais que você faça, não estará fazendo mais do que a obrigação. De certa forma, era mais fácil nesse ponto até 2015. Quando os resultados melhoram, todo o mundo aplaude. Agora, quando você não vai tão bem, aparecem os questionamentos. Sem títulos, você é mal avaliado. Ninguém vê o trabalho, só o resultado. Só que, se não fizermos planejamento, irmos pela loucura… Não adianta termos dois bons jogadores e o resto do time ruim.

Futuro do gerente de futebol e da comissão técnica
Quando me perguntaram, apoiei a renovação do Carille. Com o Alessandro, a mesma coisa. O Lúcio (Blanco) está na administração do estádio, a Nanci (Lopes), trabalhando no Parque São Jorge. Continuo com todos eles, a não ser que eles não queiram continuam comigo. Ficam falando coisas dos funcionários, que não têm nada a ver. Garanto que tem muita gente boa dentro do clube. Já comentei com o Roberto (de Andrade) sobre isso.

Cobranças por resultados e relação com a torcida
Nem sempre quem está fazendo o melhor em termos de organização vai conseguir o resultado no final. Se você comprar uma ação de uma empresa e quiser ter resultado daqui a seis meses, esquece. São dois anos no mínimo. A ação vai oscilar até crescer lá na frente. A não ser que você tenha investido errado (risos). E temos que manter os técnicos.

Processo de impeachment de Roberto de Andrade
Fui chamado no clube e me perguntaram se eu aceitava conversar com o Roberto. O Andrés, o Ademir (Carvalho), o (Guilherme) Strenger, todos estavam lá. E eu fui. Pediram opiniões sobre o que estava acontecendo na administração, e fui franco: “Roberto, você é muito ausente. Fazemos festas aqui em que você não está para recepcionar as pessoas. Você não possui ninguém que apare as arestas. O clube está acéfalo”. Apontei isso e outros pontos. O Roberto, então, me fez um convite para ser vice de futebol. Falei que ficaria ruim para ele e para mim, parecendo um conchavo.

Segundo Garcia, Roberto de Andrade o convidou para ser diretor de futebol quando estava ameaçado (foto: Sergio Barzaghi/Gazeta Press)

Ah, e quase me esqueci, eles me mostraram um negócio da Odebrecht que o Roberto assinou antes de assumir. Quer dizer, assinou depois e esqueceram de trocar a data. Havia a autenticação para provar que tinha sido depois. Isso gerou toda aquela polêmica, e um clube em que há um processo impeachment, em que chamam de ladrão, tem todos os fornecedores e patrocinadores espantados. Isso é péssimo. Eu vi que aquilo lá era só política. Aí, fomos trabalhando para apagar.

O Roberto, então, me pediu um nome para entrar na gestão. Falei para convidar o Flávio Adauto (um dos candidatos a vice-presidente do próprio Paulo Garcia), por ser corintiano e já ter exercido a função. Ainda insistiram comigo, mas não quis. Ele chamou o Flávio, e deu certo.

Depois de uns 10, 15 dias, o Roberto veio conversar comigo: “Você falou aquele negócio de o clube estar abandonado. Vê algum problema em chamar o (Antonio) Rachid (para o posto de secretário-geral)?”. Eu disse que não, que ele era grande, vacinado, um bom cara para a função. O Rachid acalmou o clube, e o Flávio acalmou o futebol. Foi tranquilo. O Corinthians não fez grandes investimentos, e tudo deu certo no final.

Conselho Deliberativo dividido em chapinhas, e não mais com um chapão
Quando houve o referendo no Conselho, eles falaram que eu era a favor do chapão. Tive que fazer um comunicado, que acabou atingindo mais de 1.000 sócios, para explicar. Eu era a favor do voto individual e da eleição em dois turnos – o primeiro, em setembro; o segundo, em outubro; e a posse, em janeiro. Seriam dois meses de transição para entrar dentro do processo, porque você pega uma caixa-preta em que não tem nem a chave da cabeça. Tudo isso está nos meus materiais, mas insistiam em dizer que eu era a favor do chapão.

Ainda continuo achando que o voto deva ser individual. Porque, queira ou não, a chapinha dá uma desagregada. Se você tem uma turma de 40 pessoas, 25 entram na chapinha e 15 ficam fora, formando outra. Aí, desagrega. Com o voto individual, quem tem mais prestígio e está atuando dentro do clube será eleito.

Para mim, o melhor seria o voto individual em um primeiro instante ou o chapão proporcional à votação das chapas de presidente. O chapão que tínhamos ficou chato porque todo o mundo falava “amém” para o presidente. Agora, deu uma divergência de grupos. Não deram cargos para uns, tiraram de outros, e acarretou nisso. Saíram brigando entre eles por causa de cargos, por causa de cara que queria isso e aquilo. Não concordo com esse negócio de trocar cargo. A chapinha vai melhorar as coisas, mas ainda não é o ideal.

Contrário ao modelo de chapinhas, candidato diz ter boa relação com situacionistas e oposicionistas (foto: Sergio Barzaghi/Gazeta Press)

Chances de vencer a eleição
Preciso de um voto a mais do que o segundo colocado (risos). Brincadeira. Não sei, é difícil saber.

Com as chapinhas, é capaz que subamos para uns 4.000 votantes. A tendência é essa, de o cara da chapinha ir buscar o voto fora do Parque São Jorge. A grande realidade é que as chapinhas são feitas de pessoas que frequentam o clube. E elas só vão ser eleitas com votos. Sendo assim, vão fomentar mais votos de quem está fora.

Não adianta muito, então, fazer campanha dentro do clube. A gente tem que buscar votos fora. Os outros quatro candidatos estão no páreo, todos no mesmo nível. É evidente que o Andrés e algumas pessoas têm mais nome, mas preciso me preocupar com todos. Se pensar só no Andrés, os outros podem me complicar.

Relacionamento com os demais candidatos
Não tenho inimigos no clube. Tenho adversários políticos. Não sou adepto do quanto pior, melhor. Sempre tive um bom relacionamento com o Andrés, por exemplo, e com os outros também. Nunca questionei nada na imprensa. Quem está lá dentro sabe do meu posicionamento.

O único compromisso que tenho é com o Flávio (Adauto) e com o Emerson (Piovesan). Não tenho acordo com ninguém. Estaria aberto para receber gente de outras chapas na minha administração, mas vou fazer tudo com o consentimento do Conselho.

Agindo assim, vou fazer coisas relevantes. O plano diretor é relevante. Farei um plano de viabilidade para ser apresentado ao sócio, e o próprio sócio também apresentará ideias. Várias virão. Ouvindo as ideias, fazendo adaptações e obtendo a aprovação no Conselho, todos terão que seguir o que foi determinado. Se não for assim, cada presidente administra o clube de uma forma diferente. O Corinthians tem que ser bem gerido.

Investimentos em outras modalidades esportivas
Sou a favor. Sou a favor, inclusive, de fazer o Cifac (Campeonato Interno dos Associados do Corinthians) para todas as modalidades. Um garoto, mesmo sendo militante, traz o pai. O associado traz o amigo, que tem o filho. E, dali, podem sair algumas estrelas. Vamos investir em outros esportes, pois todos levam o nome do Corinthians. Você precisa ser forte em tudo, ainda que o futebol seja o carro-chefe sempre.

Paulo Garcia apoia investimentos nas mais variadas modalidades esportivas, como o vôlei (foto: Sergio Barzaghi/Gazeta Press)

Temos que trazer o pessoal para o clube, fazer promoções. Se o cara trouxer três sócios, fica um ano sem pagar mensalidade. Em vez de receber R$ 1.000 dele, você recebe R$ 3.000 de outros. Ele te ajudou a prospectar sócios novos. Devemos fazer um monte de programas que agreguem pessoas. Mas, ao mesmo tempo, dar condições de uso. As instalações, num todo, estão muito envelhecidas. A organização, de uma certa forma, também. Há muita coisa ruim.

Reformular o Parque São Jorge já faz parte do plano diretor. Tenho ideias de construir um shopping lá dentro, com uma garagem grande, trazendo a iniciativa privada. Poderíamos criar também uma arena de 20.000 lugares. Isso precisa ser debatido, com um estudo de viabilidade. O que não pode é ficar do jeito que está.



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